SUBSÍDIOS PARA A
ARQUEOLOGIA SUBAQUÁTICA DE
ALAGOAS: NAUFRÁGIOS
1.
INTRODUÇÃO
Comete grande erro quem pensa ou ensina
que o patrimônio arqueológico de Alagoas resume-se, unicamente, aos sítios
arqueológicos existentes em terra e, consequentemente, aos vestígios que se
encontram sobre e sob o solo.
Neste resumido e despretensioso
trabalho, nada mais pretendo do que fornecer uma pequena visão da existência e
importância do patrimônio arqueológico subaquático e naval alagoano unicamente
reproduzindo as informações contidas nas fontes impressas de dois
conhecidíssimos e sérios cronistas: Johanes de Laet e Diogo de Albuquerque
Coelho.
2. ARQUEOLOGIA SUBAQUÁTICA E ARQUEOLOGIA
NAVAL
A Arqueologia Subaquática estuda os
sítios arqueológicos submersos entre eles, os naufrágios. Daí o trabalho de
campo ser executado em meio subaquático, onde são analisadas e recolhidas todas
as informações.
Com relação aos soçobros, é preciso não
confundir a Arqueologia Subaquática – que aplica o conciso método arqueológico à
descoberta, escavação e resgate dos artefatos – com a Arqueologia Naval – que
por falta de espaço não faço nenhum comentário - cujo objetivo é, entre outros,
investigar a estrutura do navio, o modo como foi construído e interpretar com
sentido histórico os dados arqueológicos, independente do meio em que o objeto
de estudo foi encontrado: mar, rio, lago, meios úmidos ou mesmo em
terra.
3. IMPORTÂNCIA DOS
NAUFRÁGIOS
Os naufrágios são de
extrema importância porque os inumeráveis artefatos, ainda intocados, dizem
respeito a um só momento, que é o momento do naufrágio. O tipo de embarcação que
naufragou, as condições em que se encontra, sua carga e os artefatos informa aos
arqueólogos sobre o período e as técnicas de construção, o comércio da época e
sua rota, o dia a dia das pessoas que tripulavam a embarcação e, até mesmo, o
motivo de seu soçobro. Assim, um naufrágio nada mais é do que uma máquina do
tempo sob as águas, interiores e exteriores, que não só nos conduz, mas fornece
informações imprescindíveis sobre uma época há muito
desaparecida.
4. DETECÇÃO
Delimitada a área a ser pesquisada, os
meios de detecção de naufrágios envolvem procedimentos que oscilam entre os mais
simples até a utilização de sofisticada tecnologia, e as técnicas utilizadas
para a prospecção do soçobro são as mais variadas. Para se conseguir voltar ao
local do achado costuma-se fazer uso dos mais variados instrumentos e métodos.
I. JOHANES de LAET
Johanes de Laet nasceu em 1581 e
faleceu em 1649. Escreveu várias obras de interesse geográfico e etnográfico
tanto sobre o Velho como o Novo Mundo.
Como um dos Diretores da Companhia
Privilegiada das Índias Ocidentais, foi de sua larva a importantíssima “História
ou Anaes dos Feitos da Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, desde o seu
começo até o fim do ano de 1636”, traduzida por José Hygino Duarte
Pereira e Pedro Souto Maior, e publicada pela Oficina Gráfica da Biblioteca
Nacional entre os anos de 1916-1925, no Rio de Janeiro.
É nesta obra composta por doze livros
que, a partir de 1621, Johanes de Laet conta, com abundancia de detalhes, o que
a torna de difícil leitura, a história terrestre e naval da Companhia das Índias
Ocidentais e que, também, encontramos a maior parte das informações sobre o
patrimônio subaquático e naval de Alagoas, situado no corte temporal
compreendido entre os anos de 1630 e 1634.
1. A RELAÇÃO DE
SOÇOBROS
Dos doze livros que compõem a “História
ou Anaes dos Feitos da Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, desde o seu
começo até o fim do ano de 1636”, em apenas quatro encontramos
referências a naufrágios: no livro Sétimo (1630); no Nono (1632); no Décimo
(1633); no Undécimo (1634) e, também, na CONCLUSÃO.
1.1 LIVRO SÉTIMO – ANO:
1630
PÁGINA:
88
SOÇOBRO: PORTO
CALVO
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIO
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
No
dia 25 (de dezembro) ao amanhecer o almirante Marten Thijsz, partiu do Recife
com quatro navios para cruzar ao longo da costa do Brasil em busca dos navios do
inimigo. No dia seguinte surgiu no porto do Recife o Moorinne, que viera da
costa e queimara em Porto Calvo um navio português, novo, tendo-se apoderado na
praia de cinco caixas de açúcar.
1.2 LIVRO NONO – ANO:
1632
PÁGINA:
255
SOÇOBRO: BARRA
GRANDE
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
CARAVELA
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
Embarcaram-se
novamente (as tropas holandesas estavam no rio de Serinhaém) e, tendo deixado em
Santo Aleixo os navios Grocuinghen e Haring e mandado o Fortunyn para o cabo de
Santo Agostinho, partiram em seguida para a Barra Grande (estiveram, contudo,
primeiro em porto Calvo, fizeram uma expedição a terra, mas só conseguiram 40
reses que foram repartidas pelos navios), onde não viram possibilidade para os
seus desígnios; queimaram uma das caravelas do inimigo.
1.3 LIVRO DÉCIMO – ANO:
1633
PÁGINA:
294/295
SOÇOBRO: SANTO
ANTÔNIO GRANDE E CAMARAGIBE
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIOS
NACIONALIDADE:
INGLESA E PORTUGUESA
TEXTO:
Desembarcaram a gente
um pouco ao norte do rio que chamam Santo Antônio Grande, com a intenção de
marchar diretamente dali para a bateria; mas, chegando ao rio, viram que ela se
achava do outro lado, de modo que tiveram de atravessá-lo e tomaram o reduto.
Havia seis navios inimigos, que deixaram tremular as bandeiras e as mostravam
como que desejosos por combater, havendo entre eles um provido de 10 canhões e
outro de quatro. Eram navios ingleses que atiravam valentemente contra os
nossos, de forma que um navio francês, que estava próximo destes, foi tão
baleado, que teria de submergir, se os nossos não houvessem tapado as brechas em
tempo; mas voltando do interior os nossos e atacando-os valentemente, os
tripulantes fugiram e os navios foram queimados, tanto pelo inimigo, como pelos
nossos, excetuando-se o navio francês, donde tiraram 40 pipas de vinho, tendo-se
conseguido dos navios e da terra apenas 104 caixas de açúcar. Não distante dali
havia um engenho de açúcar, cujo proprietário mandou o filho pedir humildemente
que poupassem a sua propriedade, prometendo negociar no futuro com os nossos o
seu açúcar, porém que agora não tinha nenhum; o que lhe sendo concedido mandou
no dia seguinte muito refrescos. Daí foi visitando Camaragibe e outros pequenos
portos onde destruíram ainda dois navios; de modo que causaram ao inimigo nessa
expedição a perda de 13 navios, na maior parte carregada.
PÁGINA:
302
SOÇOBRO: PORTO DOS
FRANCESES
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIO
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
Marcharam depois
disso, cerca de duas léguas para o interior, incendiaram dois engenhos e
voltaram ao rio sem embaraço algum por parte do inimigo. Fazendo-se à vela do rio Formoso e chegando
ao mar, avistaram uma embarcação, a qual deu caça até quase em frente ao Porto
Francês, onde estavam três navios, um dos quais se escapou, ao
ver que os nossos se aproximavam. O diretor da equipagem, achando pouca
probabilidade de apanhar o navio, que estavam perseguindo, entrou em Porto
Francês e tirou de lá, tanto um navio carregado com 210 caixas de açúcar, como
outro que estava vazio; e como não soubesse bem o que fazer deste, pô-lo a
pique, voltando depois ao Recife.
PÁGINA:
305
SOÇOBRO: PORTO
CALVO
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIO
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
A
expedição que partiu com o diretor da equipagem, no dia 29 de Abril, voltou no
dia 14 de Maio: estiveram os nossos em Porto Calvo, onde incendiaram um navio
novo... .
PÁGINA:
336
SOÇOBRO: PRÓXIMO A
VILA DE ALAGOAS DO SUL
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIOS
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA (?) E BRASILEIRA (?)
TEXTO:
Nessa expedição (a
Camaragibe, Tatuamunha, Porto Calvo, Porto de Pedras, Porto do Francês, Alagoas
do Sul, Alagoas do Norte, São Miguel e Coruripe)..., os nossos incendiaram
juntamente a vila de Alagoas do Sul, muitas casas e vivendas de campo e dez
navios e barcas, sem perder nenhuma gente.
1.4 LIVRO UNDÉCIMO – ANO: 1634
PÁGINA:
28
SOÇOBRO: BARRA
GRANDE
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
IATE
NACIONALIDADE:
HOLANDESA
TEXTO:
O
yacht Spiering, mandado no dia 3 (de julho) à Barra Grande para juntar-se aos
seguidos pelo nosso yacht, atearam-lhe fogo e abandonaram-no.
PÁGINA:
44
SOÇOBRO: MARECHAL
DEODORO
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
CARAVELA
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
Ao
meio dia duas companhias, a saber, as dos Capitães Picard e Mausvedt, tiveram
ordem de ir pela praia, em auxílio do Commandeur
Lichthart até Alagoa, aonde chegaram cerca de quatro horas. O
commandeur capturou ali quatro caravelas, a saber: uma carregada com cerca de
duzentas caixas de açúcar e uma partida de pau brasil; uma caravela grande cheia
de açúcar, na qual o inimigo fizera um furo e foi a pique; a terceira tendo oito
pipas de vinho; a quarta vazia.
PÁGINA:
46
SOÇOBRO: MARECHAL
DEODORO
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
CARAVELA
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
No
dia 13 incendiaram a caravela e a casa grande e tendo trazido todas as fazendas
capturadas, incendiaram as casas e abandonaram a ilha.
PÁGINA: 47
SOÇOBRO: MARECHAL
DEODORO
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
BARCA
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA OU BRASILEIRA
TEXTO:
A
força marchou novamente dali para Alagoa do Sul. Os botes tomaram em caminho uma
barca, carregada com queijo, farinha de trigo e outros víveres; tiraram alguns
queijos da barca e destruíram o resto, abriram-lhe rombos e deixaram-na afundar
em quatro braças de água.
PÁGINA:
68
SOÇOBRO: PRÓXIMO A
BARRA GRANDE
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
BARCA
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA OU BRASILEIRA
TEXTO:
No
mar sucedeu além do que já narramos o seguinte: Willem Cornelisz, capitão do
Goude Son, capturou, a duas léguas ao Norte de Barra Grande, uma barquinha de
carreira com sete caixas de açúcar e incendiou próximo dali outra
vazia.
Na CONCLUSÃO de sua extensa obra,
na “Lista dos navios, barcas, caravelas tomadas
ao inimigo pela esquadra e navios da Companhia, destruídos ou prejudicados
durante os mesmos anos”, Joannes de Laet informa:
NO ANO DE
1630:
“Um navio novo foi
incendiado junto a Porto Calvo pela esquadra do General
Lonck.”
MEU
COMENTÁRIO: Vide página 88, do
LIVRO SÉTIMO – ANO: 1630.
NO ANO DE
1631:
Pelo
Bracke:
“Um navio capturado
em frente a Porto
Calvo.”
MEU
COMENTÁRIO: aqui, deve se tratar
realmente, de uma captura não relatada no LIVRO OITAVO, referente ao ano de
1631, uma vez que em suas páginas não encontramos referências a capturas ou
soçobros.
NO ANO DE
1633:
“Levados a Pernambuco
ou destruídos cerca dali:”
1. “Onze navios
destruídos no rio Santo Antônio Grande.”
MEU
COMENTÁRIO: vide páginas 294/295 do LIVRO DÉCIMO – ANO: 1633
2. “Um navio
carregado com 210 caixas de açúcar, capturado em Porto do
Francês.”
MEU
COMENTÁRIO: vide página
302;
3. “Um outro posto a
pique.”
MEU
COMENTÁRIO: vide página
302;
4. “Um navio novo
incendiado em Porto Calvo.”
MEU
COMENTÁRIO: vide página
305;
5. “Duas barcas
incendiadas em Camaragibe.”
MEU
COMENTÁRIO: nas páginas 294/295,
Laet informa que os holandeses estiveram em “Camaragibe e outros pequenos portos
onde destruíram ainda dois navios; de modo que causaram ao inimigo nessa
expedição a perda de 13 navios, na maior parte carregada.”
Com certeza estas duas barcas devem
está incluídas neste informe das páginas 294/295, do Livro Décimo, referente ao
ano de 1633.
II. DUARTE DE ALBUQUERQUE
COELHO
Duarte de Albuquerque Coelho, também
conhecido como Visconde de Pernambuco e Marquês de Basto, nasceu em 1591 e
morreu em 1658. Era filho de Jorge de Albuquerque Coelho e foi o quarto
donatário da Capitania de Pernambuco.
Escreveu a importante e imparcial
“Memórias Diárias da Guerra do Brasil” que relata os acontecimentos sucedidos
entre 1630-638 e que foi, pela primeira vez, publicada em Madrid em
1654. A
primeira tradução desta obra para o português foi realizada por Alexandre José
de Melo Morais e Inácio Acioli de Cerqueira, e publicada em 1855, mas continha
uma série de erros. Em 1944, mais um edição foi publicada e em
1981, a
Fundação de Cultura Cidade do Recife contou com a indispensável colaboração do
grande estudioso do período holandês no Brasil, José Antônio Gonsalves de Mello,
que revisou a edição de 1944 e nos presenteou, finalmente, com uma impecável
tradução, interpretação e edição que é utilizada por todo e qualquer estudioso
que valorize a correta leitura do que realmente aconteceu.
Trata-se de um impressionante relato
diário, com base no que ele vivenciou, do que, segundo o autor, ocorreu de mais
importante a partir de setembro de 1631, como conseqüência do conflito entre as
tropas luso-espanholas e holandesas na luta pelo controle da Capitania de
Pernambuco e circunvizinhas.
1. RELAÇÃO DOS
SOÇOBROS
Das 360 (trezentas e sessenta) páginas
que compõe seu detalhado livro, só encontramos referências a naufrágios em 05
(cinco) pequenos trechos das páginas 77 (setenta e sete); 136/137; 148 e 298,
que, como veremos, obedecem, rigorosamente, aos anos 1630, 1633, e
1636.
1.1 ANO: 1630
MÊS:
NOVEMBRO
DIA:
03
PÁGINA:
77
SOÇOBRO:
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
ORIGEM DO NOME JANGADA
NACIONALIDADE:
BRASILEIRA (?)
TEXTO:
Na
noite de 3 de novembro foram o capitão de emboscadas Manuel Ribeiro Correia, o
condestável de artilharia Jorge da Fonseca Pimentel, Gonçalo de Barros e outros
mais, em jangadas, que constam de três paus unidos e amarrados, cujo nome lhes
provêm da árvore de que os tiram, que costuma servir à pescaria, tangidas por um
ou dois remos, até onde pode chegar tal frágil embarcação, se assim é lícito
chamar-lhes. Confiados pois nestes madeiros... .
1.2 ANO: 1633
MÊS:
JANEIRO
DIA:
12
PÁGINA: 136/137
SOÇOBRO: PORTO DOS
FRANCESES
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
NAVIO
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO:
Para
suprir a falta de gente, de que tanto necessitava a guerra de Pernambuco, mandou
El-Rei levantar alguma na ilha da Madeira, criando dois capitães naturais dela,
para que com mais conhecimento e comodidade se pudesse fazer. O primeiro, que
era João de Freitas e Silva, chegou com a sua companhia de 90 homens no dia 1º
de janeiro deste ano, ao pé da Paraíba, gastando muitos dias para chegar ao
Real. O outro era Francisco Bittancourt e Sá, depois mestre de campo, que chegou
a 12 do mesmo mês, ao Porto que chamam dos Franceses,
a três léguas para o sul da barra das Alagoas e 48 do Real. Trouxe 70 soldados,
e, dois dias antes de chegar àquele porto da maneira que veremos, foi descoberto
por uma nau inimiga de 38 peças, e bateu-se com ela. Trazia em sua companhia um
filho de 9 anos de idade, chamado Gaspar, que foi logo ferido de alguns
estilhaços. Durante a peleja um mosquetaço levou-lhe o braço esquerdo até o
cotovelo; e mostrando-se o pai, que o era, aflito por vê-lo daquela forma,
respondeu-lhe o moço: “Senhor, isto não me pode privar de ajudar a VM. na defesa
deste navio, porque ainda me resta o braço direito”. Se, a vista de tal sucesso,
alguém pudesse culpar Francisco de Bittacourt por haver trazido aquele filho de
tão tenra idade, ao ouvir aquelas palavras devia lisonjear-se; pois, se o não
trouxera,
não se poderia saber que em tão poucos anos existia tanta coragem!
Isto
acrescentou o valor aos que ali se achavam; pois defenderam o navio de maneira
que o inimigo perdeu a esperança de ganhá-lo, e fez-se noutra volta com 30
mortos e feridos. Não foi pequena a perda que nos coube, matando-nos 8 e
ferindo-nos 17.
O
navio, por ter recebido muitos canhonaços, ia fazendo muita água; e quando
entrou no Porto dos Franceses, tocou, com o que fez tanta, que sem remédio se
perdeu. Salvou-se a gente e algumas munições, e tudo tardou três meses
em chegar ao
Real, por causa dos muitos rios e descomodidades que impediam a
condução deste socorro, como acontecia com todos os que nos
chegavam.
MÊS:
MARÇO
DIA:
14
PÁGINA:
148
SOÇOBRO: PORTO DE
PEDRAS
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
CARAVELAS...
NACIONALIDADE:
PORTUGUESA
TEXTO: A 14 de maio foi
Calabar (figura que sai e se nomeia muitas vezes) tentar uma entrada por mar,
com 400 homens, em seis navios e oito barcaças, dirigindo-se ao Porto das
Pedras, onde desemboca o rio do mesmo nome, que passa pela Povoação de Porto
Calvo, a qual fica a cinco léguas centrais; e como Calabar era aqui mui prático,
por ter nascido naquela Povoação e Paróquia, obrou tanto a salvo, que queimou
três embarcações que estavam recolhidas no rio, bem que já descarregadas do que
haviam trazido de Portugal. Degolou sete moradores, e saqueou alguns, levando
cinco prisioneiros; quando a notícia chegou ao Real, já Calabar se tinha
retirado; porque como ficava 34 léguas para o sul, as quais ele por mar alcançou
em tão poucas horas, mal se pode remediar.
Das três embarcações que aqui
queimaram, assim como as duas no rio Formoso, algumas eram caravelas que traziam
os socorros que el-rei enviava, outras eram de mercadorias que a muito risco
mandavam, com a muita mira na ganância extrema que lhe produziam os gêneros que
vendiam como queriam; comprando aos moradores os açucares com igual usura, a que
os obrigavam os apertos em que se achavam; e, pois umas embarcações entravam
neste rio, outras naquele que melhor podiam tomar, não estando em nenhum
seguras... .
1.3 ANO: 1636
MÊS:
OUTUBRO
DIA:
16
PÁGINA:
298
SOÇOBRO: BARRA DA
ALAGOA
TIPO DE EMBARCAÇÃO:
BARCOS
NACIONALIDADE:
?
TEXTO: Quase tudo que se deixara na Alagoa do
Norte havia já chegado à vila do Bom Sucesso com a artilharia e munições
trazidas em barcos a cargo dos capitães Francisco Duarte e Francisco Peres do
Souto. Dois barcos que partiram depois deles tiveram bem diferente fortuna,
porque encontrando-os um navio inimigo, meteu a pique um que trazia oitenta e
sete barris de pólvora, e fez o outro dar à costa junto à barra da Alagoa,
salvando-se ainda muito do que se conduzia. Como se tirou tudo do quartel da
Alagoa do Norte, dispensou-se também, o tenente Alonso Ximenes de Almiron, que
voltou para Bom Sucesso. Ficaram lá só três companhias com os capitães
João da
Silva e Azevedo, que os governava por mais antigo, André de
Melo e Antônio Jacome Bezerra.
CONCLUSÃO
Acreditamos que este resumido
levantamento deixa claro que não pode existir nenhuma dúvida sobre a existência
do patrimônio subaquático de Alagoas no que se refere aos
naufrágios.
Quando comparamos as informações dos
dois cronistas, o que mais nos impressiona, no que tange ao conflito
ibero-holandês, em termos de arqueologia subaquática e, conseqüentemente, naval
em águas alagoanas, é a diferença em termos de cronologia, quantidade, local e
tipos de embarcações, dos naufrágios, pois enquanto LAET cita 29 (vinte e nove), COELHO informa apenas 05
(cinco).
Observe-se, também, que LAET afirma que
as tropas holandesas queimaram 02 (dois) navios em Porto Calvo, o que nos faz
acreditar que estavam ancorados próximos aquela antiga povoação. Daí supormos
que lá existia um rústico ancoradouro. Se esta hipótese estiver correta em
alguma parte do leito e da foz do rio Manguaba deve, com certeza, existir não só
um sítio do tipo “descarte” de artefatos, mas os restos das embarcações que
foram incendiadas. Com relação ao “descarte”, o mesmo se aplica a área que era
conhecida como a famosa “Barra Grande”.
Além do mais, ainda segundo LAET, o
Porto do Francês e, principalmente, o rio Santo Antônio, é um verdadeiro paraíso
tanto para arqueólogos subaquáticos quanto para navais, porque no primeiro
soçobrou 01 (um) navio e no segundo 11 (onze). Embarcações que ainda devem
manter sua estrutura e grande parte de sua carga totalmente
intocável.
Para uma melhor visualização e
compreensão do que afirmamos leia-se, com a devida atenção, os textos citados
pelos dois cronistas, pois sintetizam os dados fornecidos em suas extensas
obras.
Diante destas e, possivelmente, outras
revelações sobre soçobros em águas alagoanas, no corte temporal que se estende
durante todo o período de ocupação holandesa, nossa opinião é a de que a UFAL,
nosso maior centro de produção de saber deveria, de imediato, efetuar concurso
para arqueólogos subaquáticos e navais para que se resgatasse e fosse efetuado o
trabalho de laboratório nas raridades encontradas que, sem dúvida alguma, só
enriqueceria e ampliaria os horizontes culturais de nosso Estado e, após a
pesquisa, em museu apropriado, utilizando-se todos os recursos no momento
disponíveis, as expusessem para visita.
BIBLIOGRAFIA
1. BASS, George F. Arqueologia Subaquática.
Tradução de Tomé Santos Júnior.
Lisboa, Verbo, 1969.
2. COELHO, Duarte de Albuquerque. Memórias
Diárias da Guerra do Brasil.
1630-1638. Apresentação e índice
onomástico de José Antônio Gonsalves de
Mello. Recife: Fundação de Cultura
Cidade do Recife, 1982.
3. CUNHA, Luiz Octavio de Castro. Manual de
Arqueologia Subaquática: enfoque Brasil.
Rio de Janeiro, Nova Razão Cultural,
2009. 200p. :il.
4. LAET,
Johannes de. História ou Anais dos
feitos da Privilegiada Companhia das Índias Ocidentais desde sua fundação até o ano de 1636.
Tradução dos Drs. José Hygino Duarte
Pereira e Pedro Souto Maior, Rio
de Janeiro, Oficina Gráfica da Biblioteca Nacional, 1916- 1925.
5.
RAMBELLI, Gilson.
Arqueologia até debaixo d’água. São
Paulo, Maranta, 2002.
ALOISIO VILELA
DE
VASCONCELOS
ARQUEÓLOGO
PROFESSOR DA
UFAL
15.03.2010
* PUBLICADO PELO JORNAL GAZETA DE ALAGOAS EM 05.09.2015