quinta-feira, 4 de julho de 2013

Alagoas Boreal



Historiador dos mais perspicazes, o autor de Formação de Alagoas Boreal costuma se lançar em reflexões capazes de apresentar novas interpretações para pontos de vista já estabelecidos

A ARTE DE FUGIR DO ÓBVIO

Foto: FELIPE BRASIL

No recém-lançado O Grande Sertão – Os Currais de Boi e os Índios de Corso, Dirceu Lindoso investiga a introdução do gado no sertão e suas consequências para os nativos

Foto: FELIPE BRASIL

Por: RAFHAEL BARBOSA - REPÓRTER

Da varanda de seu apartamento, no bairro de Mangabeiras, todos os dias Dirceu Lindoso se depara com a mesma paisagem: de um lado a favela, populosa; do outro, um dos empreendimentos residenciais mais luxuosos da cidade. Para muitos estudiosos, o contraste logo deflagraria teorias sobre o processo de favelização em Alagoas, fenômeno que, assim como em outros estados, levou milhares de pessoas do campo para os subúrbios da capital. Em paralelo, as consequências desse êxodo e do crescimento desordenado evidenciariam o grau de desigualdade de um estado que amarga alguns dos piores índices sociais do País. Na mente do antropólogo e historiador de 79 anos, contudo, as ‘chaves’ para entender a sociedade estão num tempo anterior, quando aquele cenário era ainda uma serra habitada por índios.

Em livros como A Utopia Armada: Rebeliões de Pobres nas Matas do Tombo Real (1983), Formação de Alagoas Boreal (2000), O Poder Quilombola (2007) e Marená: um Jardim na Selva (2006), o pesquisador nascido em Maragogi exercita o que ele próprio chama de ‘etnohistória de Alagoas’. Juntas, suas publicações compõem uma densa bibliografia para o estudo não apenas da nossa formação, mas de um período que diz respeito à construção do Brasil em meio às investidas de países como Portugal, Holanda e Espanha.

Na obra de Lindoso, episódios históricos e temas discutidos em numerosos estudos ganham outros contornos. Um de nossos mais importantes intelectuais vivos, o autor costuma se lançar em reflexões particulares, capazes muitas vezes de apresentar novas interpretações para pontos de vista já estabelecidos.

Fruto de três décadas de pesquisas e dez viagens, O Grande Sertão – Os Currais de Boi e os Índios de Corso (Fundação Astrojildo Pereira), seu 15º livro, lança o estudioso num território que há séculos vem seduzindo pensadores e artistas.

Quando se fala do sertão brasileiro, não faltam referências na literatura, no cinema, na música ou nos registros históricos. Região que produziu ícones como Antônio Conselheiro e sua guerra santa, Virgulino Ferreira e o cangaço, Padre Cícero e os milagres do Juazeiro e Luiz Gonzaga e o baião, esse ambiente geográfico já foi objeto para obras de grande relevo como Vidas Secas, de Graciliano Ramos, e Os Sertões, de Euclides da Cunha, e para alguns dos filmes mais importantes do Cinema Novo, a exemplo de Deus e o Diabo na Terra do Sol.

O sertão também já surgiu sob a ótica de pensadores do porte de Josué de Castro e Ariano Suassuna. Euclides da Cunha, jornalista e escritor que vivenciou a Guerra de Canudos para depois registrar suas observações no mais fiel relato do que são os hábitos do sertanejo, deu uma contribuição definitiva para o retrato do sertão que se tem hoje. Não à toa, Os Sertões é constantemente citado no trabalho de Lindoso, e também em diversas outras publicações de referência.

O Grande Sertão tem um valor especial dentro da bibliografia sobre o tema, pois vai além das ideias que normalmente habitam nosso imaginário em relação a esse território. No livro, Dirceu Lindoso investiga um período pouco explorado pelos estudos em torno da região. Como avisa em seu subtítulo – “Os Currais de Boi e os Índios de Corso” –, a obra percorre desde o período pré-histórico, quando, acredita-se, o sertão era o fundo de um imenso oceano, até as guerras religiosas tão marcantes de sua história. Suas páginas principais, no entanto, têm como foco a introdução do gado no sertão e suas consequências para os nativos, tribos nômades como os Tapuia-Kariri, dizimadas ou submetidas a um regime de servidão pelos colonos.

Os acontecimentos verificados ali, como o historiador observa, seriam de fundamental importância para a construção de Alagoas. Com um sem número de anotações e principalmente um universo de informações na memória, Lindoso não pretende encerrar sua investigação sobre o assunto. Ainda este ano deve publicar Tapui-Retama, livro no qual retorna à temática sertaneja, dessa vez com foco na origem de Canudos e na formação do estado de Minas Gerais. Além dessa obra, ele também negocia o lançamento de uma coleção em oito volumes, fruto das aulas de Antropologia ministradas em universidades do Rio de Janeiro. 

 




 
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Alagoas Boreal


Mapa da região compreendida por Alagoas Boreal.

 

Alagoas Boreal é como era chamada a região do norte de Alagoas, que começou com a bandeira capitaneada por Cristóvão Lins, entre 1575 e 1585. Expedição responsável pela expulsão dos potiguares da região, escravizando aqueles que foram capturados vivos. O território chegou a compreender os atuais municípios de Maragogi, Japaratinga, Jundiá, Jacuípe, Porto Calvo, Porto de Pedras, Passo de Camaragibe, Matriz de Camaragibe, Colônia Leopoldina e São Luís do Quitunde. Nesta região foram implantados os primeiros engenhos de açúcar, entre os quais se destacam os engenhos de Escurial e Buenos Aires.

Referências

TENÓRIO, Douglas Apratto. O mundo do açúcar em Alagoas: A influência dos engenhos na formação histórica de Alagoas. IN: Caminhos do Açúcar: Engenhos e Casas-Grandes das Alagoas. 2ª Edição. SEBRAE.

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