Caminhos e Descaminhos da Revolução Passiva à Brasileira*
Luiz Werneck Vianna
No Brasil nunca houve, de fato, uma revolução, e, no entanto, a
propósito de tudo fala-se dela, como se a sua simples invocação viesse a
emprestar animação a processos que seriam melhor designados de modo
mais corriqueiro. Sobretudo, aqui, qualificam-se como revolução
movimentos políticos que somente encontraram a sua razão de ser na firme
intenção de evitá-la, e assim se fala em Revolução da Independência,
Revolução de 1930, Revolução de 1964, todos acostumados a uma linguagem
de paradoxos em que a conservação, para bem cumprir o seu papel,
necessita reivindicar o que deveria consistir no seu contrário - a
revolução. Nessa dialética brasileira em que a tese parece estar sempre
se autonomeando como representação da antítese, evitar a revolução tem
consistido, de algum modo, na sua realização.
Assim, neste país que desconhece a revolução, e que provavelmente
jamais a conhecerá, ela não é uma idéia fora do lugar, como não o foi o
liberalismo que inspirou a criação do seu Estado-nação. Com efeito, o
Brasil, mais que qualquer outro país da América Ibérica, esta vasta
região do continente americano que chega à modernização em compromisso
com o seu passado, pode ser caracterizado como o lugar por excelência
da revolução passiva. Como notório, aqui, a história da ruptura com o
pacto colonial, do processo da Independência e da formação de um novo
Estado-nação, diferiu da experiência da América Hispânica, que se
revestiu, ao menos em seu impulso inicial, das características de um
típico processo revolucionário nacional-libertador, abortado, no caso
brasileiro, pelo episódio da transmigração da família real, quando a
Colônia acolhe a estrutura e os quadros do Estado metropolitano. O
nativismo revolucionário, sob a influência dos ideais do liberalismo e
das grandes revoluções de fins do século XVIII, desde aí começa a ceder
terreno à lógica do conservar-mudando, cabendo à iniciativa do
príncipe herdeiro da Casa Real o ato político que culminou com o
desenlace da Independência, em um processo clássico de cooptação das
antigas lideranças de motivação nacional-libertadora.
Se as revoluções passivas européias têm a sua origem no rastro do
ciclo revolucionário de 1789 a 1848, tal como no estudo clássico de
Gramsci sobre o Risorgimento italiano, a mesma raiz está
presente na formação do Estado-nação no Brasil - a transmigração da
família real portuguesa para a Colônia é devida a um movimento
defensivo quanto à irradiação, sob Napoleão, da influência da Revolução
Francesa. Mas esse movimento defensivo era, por natureza, ambivalente:
o que significava conservação na metrópole importaria conservação-mudança
na Colônia. Nesse sentido, embora consistindo em um processo desferido
na periferia do mundo e sem alcance universal, é marca da revolução
passiva no Brasil a sua precocidade, o que certamente dotou, mais tarde,
suas elites políticas de recursos políticos a fim de manter sob
controle o surto libertário que, originário das revoluções européias de
1848, se disseminou pelo Ocidente.
A Independência foi uma "revolução sem revolução", obra de um
Piemonte sem rivais significativos, internos e externos, que não sofria
a oposição de um Vaticano, de potências estrangeiras - aliás, estava
associado à maior delas , da cultura política de cidades-Estados e de
uma aguerrida presença jacobina, e que, por isto mesmo, podia conceber a
sua realidade como uma matéria-prima dócil à sua manipulação. Assim,
se a Prússia veio a recorrer, décadas à frente, em sua busca de
modernização, à chamada "segunda servidão", o Estado que nasce da
Independência invocando o liberalismo e modelando as suas instituições
políticas de acordo com ele, intensifica a escravidão, fazendo dela o
suporte da restauração que realiza quanto às estruturas econômicas
herdadas da Colônia (Fernandes, 1975, p. 33)." Restauração
progressiva", uma vez que combinava a reatualização da base da economia
colonial com o liberalismo, o qual expressaria, na precisa
caracterização de F. Fernandes, o" elemento revolucionário" que viria a
atuar, de modo encapuzado, no processo de diferenciação da sociedade
civil, desgastando, ao longo do tempo, os fundamentos da ordem
senhorial-escravocrata (idem, pp. 38 e ss.).1
A radical ambigüidade do Estado - entre o liberalismo e a escravidão
- devia se resolver nele mesmo, instituição tensa, arquiteto de uma
obra a reclamar a cumplicidade do tempo, delegando-se ao futuro a
tarefa de vencer a barbárie de uma sociedade fragmentária e
invertebrada, até que ela viesse a corresponder e atender às exigências
dos ideais civilizatórios dos quais ele seria o único portador. Com a
decapitação política do nativismo revolucionário, em quem havia a
vocação do empreendimento econômico, como entre os homens da
Inconfidência (Maxwell, 1978, p. 141 e ss.), o Estado-nação, inspirado
no liberalismo, nascia sem uma economia que se apresentasse em
homologia a ele. Se, na sociedade civil, o liberalismo atuava como
"fermento revolucionário", induzindo rupturas moleculares na ordem
senhorial-escravocrata, ele não poderia se comportar como o princípio
da sua organização, sem acarretar com isso o desmonte da estrutura
econômica, fundada no trabalho escravo e no exclusivo agrário e que
assegurava ao Estado uma forma de inscrição no mercado mundial e
presença internacional. Ademais, o patriciado rural se comportava como
um coadjuvante insubstituível, da perspectiva das elites políticas,
para o controle de variáveis-chave como território e população. O
liberalismo devia consistir em uma teoria confinada nas elites
políticas, que saberiam administrá-lo com conta-gotas, sob o registro
de um tempo de longa duração, a uma sociedade que ainda não estaria
preparada para ele, sob pena da balcanização do território, da
exposição ao caudilhismo e à barbárie.
Tal Estado está posto, diante da sua sociedade civil, em posição de
radical autonomia, embora inexista a intenção de fazer da política um
recurso de alavancagem ou de favorecimento da modernização econômica,
como atesta a má sorte dos empreendimentos de notáveis homens de
negócios, como Mauá, e dos intelectuais de adesão americana que
buscaram fazer da empresa econômica um lugar de transformação do mundo,
como Tavares Bastos e os irmãos Rebouças (Rezende de Carvalho, 1993,
pp. 193 e ss.).2
Daí que, como bem notou José Murilo de Carvalho, não se possa
compreender o Estado imperial como um caso de modernização conservadora
(Carvalho, 1980, p. 39).
Para as elites políticas do novo Estado-nação a primazia da razão
política sobre outras racionalidades se traduz em outros objetivos:
preservação e expansão do território e controle sobre a população. A
Ibéria, em sua singularidade, ressurgiria melhor na América portuguesa
do que na hispânica, onde o liberalismo teve força mais dissolvente por
ter sido a ideologia que informou as revoluções nacional-libertadoras
contra o domínio colonial. E a Ibéria é territorialista, como o será o
Estado brasileiro - nisto, inteiramente distante dos demais países da
sua região continental -, predominantemente voltado para a expansão dos
seus domínios e da sua população sobre eles - a economia seria
concebida como uma dimensão instrumental aos seus propósitos políticos.3
Não são as estruturas econômicas herdadas da Colônia que impõem a
forma do Estado, e sim o oposto: é o Estado que, ao restaurá-las,
inicia a sua história com a única alternativa econômica compatível com a
vocação da sua estratégia territorialista. O período da Regência vai
deixar claro que o impulso americano em favor da livre iniciativa, do
mercado e da descentralização política, se podia trazer a afirmação da
liberdade, certamente implicava a perda da unidade territorial. E esse
compromisso do Estado de forma liberal com meios pré-capitalistas de
extração do excedente econômico vai caracterizar, na ampla galeria de
casos nacionais de revolução passiva, a solução brasileira como talvez a
sua modalidade mais recessiva, e não apenas por sua precocidade, mas
sobretudo pelo sistema de orientação pré-moderno das suas elites
políticas, cujo liberalismo é prisioneiro do iberismo territorialista.
Não há Piemonte nem Prússia, a Ibéria permite de bom grado que os seus
americanos cultivem o seu ethos e sua paixão pela empresa
individual, mas nada fará para ajudá-los, principalmente enquanto as
suas demandas e pleitos pareçam ameaçar a sua estratégia
territorialista. Assim como na tradição do iberismo pombalino, não há
restrições à matriz do interesse individual, desde que ela se afirme de
modo subordinado às razões do interesse nacional (Maxwell, 1995, p.
108).
No futuro e pelo decurso natural dos fatos, em sua progressão
molecular, sob o escrutínio de suas elites políticas, o Estado vai se
encontrar com a sua sociedade. A antítese deve ceder diante da tese, a
dialética se resolve em" tranqüila teoria",4 o protagonismo deve caber aos fatos, e não ao ator,5
e ninguém melhor que Joaquim Nabuco fixou os traços dessa cultura
política:" Há duas espécies de movimento em política: um, de que fazemos
parte supondo estar parados, como o movimento da Terra que não
sentimos; outro, o movimento que parte de nós mesmos. Na política são
poucos os que têm consciência do primeiro, no entanto, esse é, talvez, o
único que não é uma pura agitação" (Nabuco, 1957, p. 133).
Contudo, se o Estado é moderno no seu liberalismo, essa sua condição
deve ser reprimida, apenas vivenciada no plano da consciência das suas
elites, constrangido, inclusive por sua índole constitutivamente
territorialista, a consagrar o patrimonialismo e a estrutura anacrônica
do sistema produtivo que herdou da Colônia. No Estado e na sociedade
nacionais, como escreveu F. Fernandes em páginas clássicas sobre a
Independência, o liberalismo era "um destino a ser conquistado no
futuro" (Fernandes, 1975, p. 35). Autocontido, sem mobilizar a política
como instrumento de mudança econômica, esse Estado, que aparenta
cultuar o quietismo, quer ser o administrador metafísico do tempo,
fator que estaria dotado, em si, da inteligência de produzir, por
movimentos quase imperceptíveis, a mudança que viesse a reparar a
irremediável incompletude e rusticidade da sociedade e do homem
brasileiros. Um e outro, como vieram ao mundo, não lhe poderiam servir
como ponto de partida para sua obra civilizatória.
A dialética brasileira como "tranqüila teoria" encontra a sua
expressão paradigmática na questão racial: o brasileiro, "porque ainda
não temos uma feição característica e original" (Romero, 1953, vol. 1,
p. 110), não conformaria uma raça sociológica, carência irremediável
que estaria a comprometer o seu caminho rumo à civilização. Como tipo
humano, o brasileiro também seria "um destino a ser criado no futuro",
já em processo de constituição no terreno dos fatos - a
miscigenação -, e que se confia à ação benfazeja do tempo, que viria
corrigir a morbidez da população, "de vida curta, achacada e pesarosa" (idem): "dentro de dois ou três séculos a fusão étnica estará talvez completa e o brasileiro mestiço bem caracterizado" (idem, p. 112).
Desde as crises da Regência, com seus riscos de secessão e de
desordem social, os liberais orientados pelo mercado e pela cultura
material, declinam, na prática, do papel de reformadores sociais,
limitando-se a prescrever a necessidade de uma auto-reforma do Estado,6
embora não tenham abandonado a sua publicística de denúncia do
burocratismo de estilo asiático do Estado, como em Tavares Bastos.7
O liberalismo "de sociedade civil" se manterá imune às tentações
jacobinas, recusando-se a realizar interpelações" para baixo" e a
procurar pontos de ruptura com as elites territorialistas. Na linguagem
da época, nada mais parecido com um conservador do que um liberal
(Mattos, 1987; Carvalho, 1980, p. 181). Daí que a ação oposicionista do
liberalismo de orientação americana acabe por confirmar a percepção,
tão cara àquelas elites políticas, de que um sistema de oposições
deveria encontrar a sua resolução mais na busca de um ponto de
equilíbrio do que em confrontos abertos (Araújo, 1994, p. 175).
Deve-se a Oliveira Vianna a compreensão de que o fiat da
vocação territorialista residia na questão do exclusivo agrário, e de
que, aí, estaria contida a única possibilidade para os liberais se
credenciarem como uma força hegemônica: "nessa luta entre as aspirações
liberais e o princípio da autoridade, tivessem os liberais e a
democracia, aqui [no Centro-Sul], para auxiliá-los, como tiveram no
norte e no extremo-sul, a lança do guerrilheiro ou o jagunço do cangaço-
e a grande obra da organização nacional estaria contaminada e
destruída" (Vianna, 1973, vol. 1, p. 289).
Na ausência deste encontro intelectuais-povo, a revolução burguesa
seguiu em continuidade à sua forma "passiva", obedecendo ao lento
movimento da transição da ordem senhorial-escravocrata para uma ordem
social competitiva, chegando-se, com a Abolição, à constituição de um
mercado livre para a força de trabalho sem rupturas no interior das
elites, e, a partir dela, à República, em mais um movimento de
restauração de um dos pilares da economia colonial: o exclusivo
agrário, que agora vai coexistir com um trabalhador formalmente livre,
embora submetido a um estatuto de dependência pessoal aos senhores de
terra.
A expansão da ordem burguesa, e com ela seus personagens sociais da
vida urbana - empresários, intelectuais, operários, os militares
recrutados nas camadas médias citadinas- , vai tornar-se em caldo de
cultura ideal para ativação do "fermento revolucionário" do liberalismo
de que falava Florestan Fernandes, no contexto de uma sociedade ainda
permeada pela ordem patrimonial. E vai ser em torno do cânon liberal,
principalmente por meio do sindicalismo operário, em suas postulações
por direitos sociais, e da juventude militar, em sua denúncia do
sistema eleitoral a serviço das oligarquias agrárias, que o elemento da
antítese encontra a sua primeira raiz na sociedade brasileira com a
formação do Partido Comunista Brasileiro - PCB - e com a rebelião do
tenentismo que culminou com a Coluna Prestes. As amplas demandas por
modernização econômica e social são acolhidas por setores tradicionais
das elites, sob a liderança dos estados de Minas Gerais e do Rio Grande
do Sul, que, com o apoio de parte do tenentismo, das camadas médias e
da vida popular nos centros urbanos, iniciam, com a chamada Revolução
de 1930, um novo andamento à revolução burguesa, já agora sob a chave
clássica de uma modernização conservadora.
Com o movimento político-militar de 1930, a Ibéria se reconstrói,
sem se desprender, contudo, das suas bases agrárias, de onde as elites
tradicionais extraem recursos políticos e sociais para a sua conversão
ao papel de elites modernas, vindo a dirigir o processo de
industrialização. Porque em sua história brasileira, o liberalismo não
encontrou quem assumisse com radicalidade a sua representação, a
sociedade de massas emergente com a urbanização e a industrialização
seria indiferente a ele. Em sua nova configuração, a revolução passiva
terá como "fermento revolucionário" a questão social, a incorporação
das massas urbanas ao mundo dos direitos e a modernização econômica
como estratégia de criar novas oportunidades de vida para a grande
maioria ainda retida, e sob relações de dependência pessoal, nos
latifúndios.
Nessa Ibéria renovada, o ator procura afirmar o seu protagonismo sobre os fatos,
deixando de confiar na cumplicidade do tempo, a essa altura já tendo
por que temer a possibilidade de se ver ultrapassar pelo movimento da
sua sociedade. Não há mais lugar para o quietismo que apostava no futuro
- o "destino" se tornou uma tarefa a ser cumprida no tempo presente.
Por meio da industrialização, projeto da política, a sua vocação
territorialista vai propiciar a formação de uma economia homóloga a ela,
posta a serviço da grandeza nacional, como na ideologia do Estado
Novo- uma economia politicamente orientada, economia programática de
um capitalismo de Estado, as elites políticas à testa de uma nação
concebida como uma comunidade orgânica. Subsumir a antítese, nesse novo
contexto dinamizado pelas expectativas de mudança social, importa
admitir a subsunção, ainda que parcial, da sua energia.
No binômio conservação-mudança, o termo mudança passa a
comportar conseqüências que escapam inteiramente à previsão do ator,
gerando expectativas de que a via do transformismo poderia ser
concebida como a melhor passagem para a democratização do país. Sérgio
Buarque de Holanda, escrevendo em 1936, registrava essa possibilidade:
"A forma visível dessa revolução [a revolução democrática] não será,
talvez, a das convulsões catastróficas, que procuram transformar de um
mortal golpe, e segundo preceitos de antemão formulados, os valores
longamente estabelecidos. É possível que algumas das suas fases
culminantes já tenham sido ultrapassadas, sem que possamos avaliar desde
já sua importância transcendente" (Holanda, 1977, p. 135).
Nos anos 50, sob o governo de Juscelino Kubitschek - lembrar que
Juscelino foi prefeito "biônico" de Belo Horizonte à época do Estado
Novo, e eleito presidente pela coalizão PSD-PTB, partidos criados por
Vargas na transição daquele regime para o da democracia de 1946 -, o
transformismo se traduz em uma "fuga para a frente", o ator em luta
contra o tempo - os "cinqüenta anos em cinco" -, queimando etapas como
na construção de Brasília e na abertura da fronteira oeste para o
capitalismo brasileiro. A vitalidade do processo de transformismo
empresta, por suas realizações, principalmente econômicas, legitimidade
às elites políticas territorialistas - objetivos de território e de
população faziam parte das orientações dominantes do governo Juscelino
-, isolando social e politicamente as elites do liberalismo econômico e
a esquerda, como a que marcou a sua posição no Manifesto de Agosto, de 1950, do PCB, que desejavam, por motivações de sentido oposto, interromper o seu curso.
Substantivamente, o transformismo se fazia indicar pelo
nacional-desenvolvimentismo, programa que devia conduzir a um
capitalismo de Estado à base de uma coalizão nacional-popular, sob a
crença de que o atraso e o subdesenvolvimento poderiam ser vencidos a partir de avanços moleculares derivados da expansão do moderno. A mudança social teria sua sorte, então, hipotecada aos fatos,
em particular aqueles originários da vontade política que comandava a
impulsão da economia, em um tempo necessariamente acelerado. Sob esta
chave, a revolução passiva se constitui em um terreno comum às elites
políticas, ao sindicalismo, à intelligentzia e à esquerda, especialmente o PCB.
A Declaração de Março, do PCB, em 1958, pela primeira vez na
história da esquerda no país, se identifica com uma proposta de ruptura
que não inclui como necessário um" momento explosivo de tipo francês".
Com essa Declaração, a revolução passiva deixa de ser o cenário
exclusivo das elites, passando a incorporar o projeto de ação do ator
da antítese, cujo objetivo é o de introduzir o elemento ativo no
processo de transformismo que estaria em curso: "O caminho pacífico da
revolução brasileira é possível em virtude de fatores como a
democratização crescente da vida política, o ascenso do movimento
operário e o desenvolvimento da frente única nacionalista e democrática
em nosso país" (PCB, 1980, p. 22). Não se trata, pois, de
denunciar" a revolução sem revolução", mas de percebê-la em registro
positivo com a finalidade de ativar o gradual e o molecular:
"O povo brasileiro pode resolver pacificamente os seus problemas
básicos com a acumulação, gradual mas incessante, de reformas profundas e
conseqüentes na estrutura econômica e nas instituições políticas,
chegando-se até à realização completa das transformações radicais
colocadas na ordem do dia pelo próprio desenvolvimento econômico e
social da Nação" (idem).
A atividade desse ator aparece, porém, como prisioneira dos fatos,
cabendo a eles - "ao desenvolvimento capitalista nacional" - o papel
de "elemento progressista por excelência da economia brasileira",
"desenvolvimento inelutável" que induziria o avanço do moderno sobre o
atraso (idem, p. 4). A esquerda descobria o tema do transformismo
como uma nova alternativa para a mudança social, mas esta descoberta,
porém, se fazia em um terreno estranho ao seu - o do Estado, da
burguesia nacional e das elites políticas de tradição territorialista. O
ator que devia" ativar" o transformismo dependia de movimentos sobre
os quais não possuía controle, na confiança de que eles respondiam a
necessidades objetivas, "inelutáveis", o que, a rigor, significava
abdicar do seu protagonismo em favor dos fatos. Nesse sentido, a Declaração de Março
vinha a confirmar, "por baixo", a cultura política das elites
territorialistas, com que, ademais, se identificava na centralidade
concedida ao papel do Estado como organizador social.
O longo fluxo da revolução passiva brasileira, com o golpe militar
de 1964 - sintomaticamente autodesignado como revolução -, pareceu, de
imediato, ter encontrado o seu termo de conclusão. Com efeito, durante o
primeiro governo militar teve essa implicação, com a valorização do
mercado em detrimento do Estado, o empenho na orientação de emancipar a
economia de fins políticos, e o abandono de uma política externa
independente. A derrota dos territorialistas e da coalizão política que
os sustentava, abre, então, a oportunidade para a reforma liberal das
estruturas do Estado e das suas relações com a sociedade, cumprindo-se
uma americanização "por cima" e o acerto de contas com a tradição
ibérica.
A esta ruptura no campo das elites se acrescenta aquela que vai
ocorrer no sistema de orientação da esquerda, quando uma parte
significativa dela faz a opção em favor do caminho da ruptura
revolucionária, denunciando a política do gradualismo reformista, como
no enunciado da Declaração de Março, como a responsável pela
vitória do golpe militar. Segundo o seu argumento, as coalizões
pluriclassistas deveriam dar lugar a uma política definida a partir dos
setores subalternos, em particular do movimento operário. A democracia
populista do pré-64 "não procedia de qualquer pluralismo real",
constituindo-se em uma aberta manipulação consentida das massas
populares, implicando, na verdade, "uma autocracia burguesa
dissimulada" (Fernandes, 1975, pp. 339-40). A antítese não poderia
nascer do nacional-popular, e sim do terreno da luta aberta de classes,
e, se o capitalismo não poderia prescindir do autoritarismo, marca
intrínseca ao seu modo de manifestação no país, as lutas pela
democracia incorporavam uma carga de sentido anticapitalista (Fernandes,
1975, pp. 364 e ss.; Velho, 1976, p. 241).
Não por acaso, é da intelligentzia de São Paulo que virão os
fundamentos mais persuasivos em favor da ruptura revolucionária. Estado
de economia vigorosa, com uma estrutura de classes assemelhada à
européia, com suas clivagens definidas em termos de interesse, a via do
transformismo em São Paulo, como em Florestan Fernandes, relevava
sobretudo a sua dimensão societária - a lenta e gradual transição da
ordem patrimonial para a ordem social competitiva, cujos efeitos, entre
nós, se revestiriam de um alcance comparável às revoluções burguesas
na Europa (Fernandes, 1977, p. 36).8 Para a intelligentzia
paulista, ainda antes de 1964, a aliança da esquerda com as elites
territorialistas em torno do Estado e de um projeto
nacional-desenvolvimentista implicava convalidar a reciclagem do domínio
das elites tradicionais, "como se o Brasil arcaico devesse sempre
preponderar sobre o Brasil moderno" (idem, 1976, p. 329). O nacional-desenvolvimentismo, simulando representar os" interesses da comunidade como um todo" (idem,
p. 221), traduziria, no fundamental, os interesses privilegiados das
elites. Daí que o programa intelectual paulista, já na passagem dos anos
50 para os 60, não ponha ênfase na questão do Estado, centrando-se nos
personagens de mercado, do mundo dos interesses e da realidade fabril
(Rezende de Carvalho, 1994, p. 46).
O golpe militar seria a melhor evidência do que havia de equívoco no
projeto nacional-reformador de estilo populista, com o que uma parte
da esquerda subscreve o diagnóstico da intelligentzia de São
Paulo. Interpretando as raízes da falência da democracia do regime de
1946, e na esteira da análise anterior de Florestan Fernandes, uma
série de estudos, logo altamente influentes, como os de F. H. Cardoso,
O. Ianni e F. Weffort,9
procurava situar sob nova perspectiva a cultura política da esquerda:
romper com o campo intelectual da revolução passiva, a ser ignorada
mesmo como "critério de interpretação"; denunciar o reformismo populista
e a forma de Estado do iberismo territorialista; sinalizar em direção a
uma via de ruptura com o capitalismo autoritário brasileiro. O
derruimento político das alianças pluriclassistas, construídas em torno
do Estado e à base do suposto falacioso de que existiria uma insanável
oposição entre o capitalismo periférico e o capitalismo central, devia
ser sucedida pelo tema da identidade e da autonomia de classes, cuja
plena inteligibilidade e melhor expressão se faria indicar pela adesão à
chave dos interesses. Da configuração classe-identidade-interesse se
chegaria à mobilização contra a exploração capitalista, e, dela, ao
confronto com o Estado autocrático que a garantia. Do sindicalismo
orientado pela questão do desenvolvimento e da nação ao sindicalismo
revolucionário, como em Osasco, de 1968.
A revolução passiva fora uma obra da cultura política dos
territorialistas, e seus momentos de reformismo, sob o regime
populista, teriam produzido o efeito negativo da cooptação dos seres
subalternos, o cancelamento da sua identidade e o aprofundamento das
condições do estatuto da sua dominação. Acresce que, com o novo ciclo
iniciado pelo segundo presidente do regime militar - o general Costa e
Silva -, territorialista era também a ditadura com sua doutrina
expansionista de Brasil-grande potência. Romper, no plano da política,
com o contexto intelectual da revolução passiva, se fazia, assim,
associar a uma idéia igualmente de ruptura com o próprio legado
histórico formador da sociedade brasileira: a cultura política da Ibéria
considerada como um peso opressivo pelo seu autoritarismo-burocrático,
parasitismo e natureza cartorial, tal como na tradição liberal de um
Tavares Bastos, à qual se concedeu uma nova animação com o clássico Os Donos do Poder
de Raimundo Faoro, cujo êxito tardio - o livro é de 1958, mas só foi
incorporado como presença obrigatória nos estudos sociais brasileiros em
fins da década seguinte - veio a coincidir, e não à toa, com a nova
valorização concedida à matriz do interesse como estratégia de
organização social.
Contudo, a forma de resistência à ditadura que abriu caminho para a
transição à democracia foi a das rupturas moleculares, tendo como
inspiração principal os temas da democracia política, os quais,
sobretudo a partir de meados dos anos 70, foram crescentemente
vinculados aos da agenda da democratização social. Foi deste binômio
democracia política-democratização social, já identificado, quase duas
décadas atrás, como estratégico pela esquerda na Declaração de Março,
que se extraiu uma política de erosão - e não de enfrentamento direto -
das bases de legitimação do poder autoritário, combinando-se a
eficácia nas disputas eleitorais- então heterodoxamente convertidas em
"formas superiores de luta" - com a defesa dos interesses do
sindicalismo e a explicitação de uma nova pauta de direitos a serem
conquistados pelos setores subalternos.
Não havia, como se verificou, nexos intrínsecos e inamovíveis entre
capitalismo e regime político autocrático, tal como defendiam os
adeptos da ruptura revolucionária, vindo a se conquistar a democracia
política, em um contexto de mobilização de massas por parte da oposição
democrática e de fortalecimento da vida sindical e associativa dos
setores subalternos, sem se alterar a forma de propriedade. A
institucionalização da democracia política, com a promulgação da Carta
de 1988, de abrangência inédita na história do país, eliminou, ao menos
em tese, obstáculos institucionais e constitucionais que viessem a
interditar, como observava Gramsci, a "passagem molecular dos grupos
dirigidos a grupos dirigentes" (Gerratana, 1975, p. 1056).
A transição política do autoritarismo à democracia reabre, em
condições novas, a agenda da revolução passiva: em primeiro lugar,
porque as elites políticas do territorialismo foram afastadas do
controle do Estado, tendo sido sucedidas por uma coalizão de forças
cada vez mais orientada por valores de mercado e pelo projeto de
"normalização" da ordem burguesa no país, o que implicaria, além de uma
ruptura com o passado - "o fim da era Vargas" - a subordinação de
todas as dimensões do social a uma racionalidade derivada das
exigências de modernização capitalista; em segundo, porque o seu
"fermento" não está mais no liberalismo, nem na questão social, como no
momento da incorporação dos trabalhadores ao mundo dos direitos
sociais sob a ação tuteladora e organizadora do Estado. O" fermento" é a
democracia, tal como se manifesta no processo de massificação da
cidadania, ora em curso, cuja expressão paradigmática se indica no
movimento dos trabalhadores sem-terra, em razão da singularidade de
suas demandas sociais: porque o seu objeto é a terra - um bem de
natureza política -, cada avanço seu na agenda da democratização
social tem incidido positivamente no avanço da democracia política,
inclusive porque leva ao isolamento os setores mais retrógrados das
elites, cuja sustentação política tradicionalmente derivou do exclusivo
agrário.
E não é à toa que o "programa" das elites se orienta no sentido de
interromper o livre curso da comunicação entre a democracia política e
os processos de democratização social, com a finalidade de racionalizar
a participação política, como na proposta do atual governo de reforma
política na revisão constitucional. No caso, tem-se em vista
administrar" por cima", seletivamente, o ingresso à cidadania, em uma
democracia política lockeana entregue à razão judiciosa de suas elites
ilustradas, empenhadas na conclusão da revolução burguesa por meio da
ordenação estável da sua estrutura de classes.10
Se a revolução passiva das elites territorialistas traduziu o seu
programa de criar uma nação para o seu Estado, a nação que vem
emergindo do processo de conquista de direitos e da cidadania por parte
das grandes maiorias ainda não concebeu o seu Estado. A história da
sua constituição tem-se dado mais no plano societário, americanização
tardia, "por baixo", que se realiza em um movimento de rupturas
moleculares com o que importa constrangimentos à sua autonomia e em
suas ações em defesa dos seus interesses e direitos. A política, porém,
não é especular à "sociologia", e somente ela concede acesso à questão
do Estado, sem o domínio da qual um grupo dirigido não se converte em
dirigente. A democracia, como palavra-chave do "critério de
interpretação" (Gerratana, 1975, p. 1827) da esquerda sobre a sua forma
de inserção na revolução passiva à brasileira, para que se converta na
base de um transformismo ativo, suportado pela ação do ator, ainda
está aguardando que essa nova força emergente do social se encontre com a política, incluída aí a sua história no país e as suas melhores tradições.
(Recebido para publicação em novembro de 1996)
*
Texto elaborado a partir da transcrição da gravação da conferência de
mesmo título produzida pelo autor no Ciclo de Conferências,"
Alternativas e Dilemas do Brasil no Fim do Século", organizado pelo
IUPERJ, Rio de Janeiro, 12-16 de agosto de 1996. As citações que
acompanham o texto, em sua quase totalidade, são as que foram
mobilizadas na conferência, daí o seu caráter não exaustivo e as
inevitáveis omissões.
Notas:
1.
Azevedo Amaral também enfatiza o "elemento revolucionário" na"
realização da Independência dentro da ordem de continuidade das
tradições políticas da colônia, com a colocação do príncipe herdeiro da
coroa portuguesa à testa do movimento separatista". Segundo ele, "a
continuidade das tradições dinásticas, pela elevação do príncipe regente
ao trono imperial brasileiro, não bastou para tirar ao movimento emancipador o caráter revolucionário (Azevedo Amaral, 1963, p. 98 e 101, ênfases nossas).
2.
Sobre os intelectuais americanistas e suas desventuras como
heróis-empresários versa a pesquisa de Maria Alice Rezende de Carvalho,
ainda em andamento, centrada na trajetória de André Rebouças, a qual
confirma e desenvolve algumas sugestões analíticas aqui indicadas.
3.
Como distingue G. Arrighi, "os governantes territorialistas
identificam o poder com a extensão e a densidade populacional de seus
domínios, concebendo a riqueza/o capital como um meio ou um subproduto
de busca de expansão territorial". Contrariamente, os governantes de
orientação capitalista consideram as aquisições territoriais um meio e
um subproduto da acumulação de capital (Arrighi, 1994, pp. 33,
121-124).
4.
Para Gramsci, a dialética sem síntese, como em B. Croce,
caracterizaria o" hegelianismo dos moderados" como uma "tranqüila
teoria" (Gerratana, 1975, pp. 1160, 1473). "[A dialética sem síntese],
concedendo primazia aos fatos, estaria orientada para suprimir
ou abafar a atividade dos seres sociais que emergiam com a
democratização social. Ter-se-ia um processo de transformismo
ininterrupto, em que a ordem burguesa sempre se reporia - a Inglaterra
seria o melhor exemplo- pela incorporação, selecionada pelas elites,
de grupos e de indivíduos em posição subordinada" (Werneck Vianna,
1995a, p. 224).
5.
No curso da revolução passiva, a hipótese de Gramsci é a de que a
imobilização do ator da antítese não levaria "à estagnação do processo
de mudança, uma vez que o ator como que passaria a ser representado
veladamente pelos fatos (Werneck Vianna, 1995a, p. 222): "[...] protagonistas os fatos,
por assim dizer, e não os homens individuais. Sob um determinado
invólucro político necessariamente se modificam as relações sociais
fundamentais e novas forças políticas efetivas surgem e se desenvolvem,
que influem indiretamente, mas com pressão lenta e incoercível, sobre
os setores dominantes, fazendo com que eles mesmos se modifiquem sem se
dar conta disso, ou quase" (Gerratana, 1975, pp. 1818-19).
6.
Para Tavares Bastos, os "males do presente" não se devem ao singular
atraso social brasileiro, mas à organização do Poder, à forma do Estado
(Werneck Vianna, 1991, p. 157). Para ele, "no estado evolucionário de
nossa sociedade há, é certo, altos problemas morais e sociais que
interessam igualmente, ou muito mais, à sorte do povo: a instrução, o
trabalho livre, a liberdade dos cultos, por exemplo, mas todos dependem da solução dada à forma de governo, questão prévia que domina as outras" (Tavares Bastos, 1976, p. 140, ênfases nossas).
7. Em A Província,
dizia Tavares Bastos que "Portugal [...] declinava para o absolutismo
asiático quando se estabelecia nas costas da América, ao passo que a
Inglaterra, precursora da liberdade moderna, marchava para a civilização
quando os puritanos aportaram ao Novo Mundo" (Tavares Bastos, 1975, p.
50).
8.
O ensaio citado nessa coletânea de textos de Florestan Fernandes, "O
Desenvolvimento Histórico-Social da Sociologia no Brasil", foi
originalmente publicado em 1958.
9.
A" biblioteca" mínima e essencial à denúncia do transformismo e de
demonstração da necessidade de uma ruptura política na sociedade
brasileira está nos estudos de F. H. Cardoso sobre os empresários e as
relações centro-periferia, quando se defende a natureza associada do
capitalismo brasileiro ao internacional - não haveria, então, uma
"burguesia nacional" -, e nos de O. Ianni e F. Weffort, que sustentam
que o nacional-populismo teria conduzido a classe operária a uma posição
de subordinação à burguesia nacional, representada por seu Estado,
incapacitando-a de defender a democracia e suas conquistas anteriores
(Cardoso, 1964 e 1970; Ianni, 1971; Weffort, 1978; estes trabalhos,
salvo o primeiro, foram publicados pela primeira vez, parcial ou
inteiramente, no transcurso da década de 60).
10. Esta análise se encontra desenvolvida em Werneck Vianna (1994; 1995b; 1996).
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ABSTRACT
The Directions and Misdirections of Brazils Passive Revolution
The Directions and Misdirections of Brazils Passive Revolution
This essay addresses the process of Brazils passive revolution, an
ongoing "revolution without revolution" that has dominated the movement
of Brazilian society from the founding days of the nation-state
through contemporary times, where the predominant topic has become the
universalization of citizenship. Against a backdrop of emerging
democracy, institutionalized through Brazils 1988 Constitution, the
essay asks about the chances of seeing a reversal in the direction of
the binomial characteristic of passive revolutions- conservation change -
towards a movement that places more emphasis on change rather than on
conservation. Such a reversal would call for an actor identified with
the expression of the antithesis, an actor who must in particular be
capable of dealing with the relations between political democracy
expressed within an institutional arena, on the one hand, and the
process of social democratization, on the other - as has been the case
of todays Landless Workers Movement. Although within the social arena
social movements have managed to trigger molecular ruptures in the forms
of domination to which they have traditionally been exposed, if they
are to turn this process of transformismo to their favor, they
must move into the realm of the state, something that will inevitably
require these actors to enter into alliances and to endeavor to gain
recognition as general interpreters of their society.
Keywords: Passive revolution; citizenship; landless workers movements; social movements
RÉSUMÉ
Cheminements et Égarements de la Révolution Passive à la Brésilienne
Cheminements et Égarements de la Révolution Passive à la Brésilienne
Dans cet article on examine le processus de révolution passive au
Brésil, une incessante "révolution sans révolution", qui dirige le
mouvement de la société brésilienne depuis ses débuts comme Etat-nation
jusquà nos jours, où la question de la citoyenneté simpose. On cherche
ici à vérifier les possibilités, face à lémergence de la démocratie
institutionnalisée suivant la Constitution de 1988, dun retournement
dorientation du binôme situation-changement, apanage des révolutions
passives, au profit dun mouvement remplaçant le statu quo par le
changement. Ce retournement pourrait relever du comportement dun acteur
représentant lantithèse de ce mouvement, surtout par son aptitude à
faire face aux rapports entre, dun côté, laspect institutionnel de la
démocratie politique et, de lautre côté, le processus de démocratisation
sociale tel que laccomplit, aujourdhui, le Mouvement des Travailleurs
Sans-Terre. Si les mouvements sociaux ont donc réussi, dans le cadre de
la société au sens large, à faire éclater certaines formes de
domination auxquelles les travailleurs ne cessent dêtre soumis, par
ailleurs, pour aboutir au revirement du processus en leur faveur, il
leur faudrait pouvoir approcher les mécanismes de lÉtat, ce qui suppose
le chemin des alliances et des efforts quun acteur sera obligé de
mettre en place afin dêtre reconnu comme interprète de la société où il
vit.
Mots-clé: Révolution passive; citoyenneté; Mouvement des Travailleurs Sans-Terre; mouvements sociaux
Para citação:
Vianna, Luiz Werneck. Caminhos e Descaminhos da Revolução Passiva à Brasileira. In: Dados, vol. 38, nº. 1, Rio de Janeiro, 1996.
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