Proprietário de terras nordestino (1600?-1635). Durante o período dasinvasões holandesas, apóia os intrusos contra os portugueses e é considerado traidor pelas autoridades coloniais. Domingos Fernandes Calabar nasce em Porto Calvo, Alagoas, então parte integrante da capitania de Pernambuco.
Mulato, estuda com os jesuítas e torna-se senhor de terras e engenhos. A partir de 1630 luta contra os holandeses sob as ordens de Matias de Albuquerque, governador da capitania. Profundo conhecedor da região, prepara emboscadas nas quais os invasores são sistematicamente derrotados. Em 1632 passa a auxiliá-los em troca da liberdade civil e religiosa que oferecem a quem os apoiar.
Além de Calabar, aderem à proposta cristãos-novos, negros, índios e mulatos. Ele orienta os ataques às vilas de Igarassu e Goiana, à ilha de Itamaracá e ao forte de Rio Formoso, que obrigam as tropas coloniais portuguesas a recuar para o norte.
Numa contra-ofensiva em Porto Calvo, o governador pernambucano supera as forças holandesas e consegue vencê-las em 1635. Calabar é preso, mas insiste em defender sua convicção de que o domínio holandês seria mais benéfico para o Brasil do que o controle português. Nesse mesmo ano é enforcado por ordem de Matias de Albuquerque.
Calabar - o elogio da traição, de Chico Buarque de Hollanda e Ruy Guerra
Peça teatral sobre a traição de Calabar, personagem da história brasileira que foi considerado traidor por ficar ao lado dos holandeses na guerra contra Portugal.
Na década de 70, a dramaturgia nacional era alvo do mesmo patrulhamento que cerceava a liberdade de músicos, políticos, escritores, educadores e tantos outros. É neste contexto que dois importantes artistas escrevem uma das páginas mais importantes do teatro brasileiro contemporâneo. Exemplo de utilização da matéria histórica como instrumento gerador de reflexão, Calabar - o elogio da traição, de Chico Buarque de Hollanda e Ruy Guerra, é relançado pela Civilização Brasileira com novo projeto gráfico.
Calabar - o elogio da traição, escrita justamente entre os anos de 1972 e 1973, no auge da ditadura militar brasileira e as vésperas do abril florido da revolução portuguesa — o que criou obstáculos à montagem da peça — é uma alegoria histórica que se passa na época das invasões holandesas em Pernambuco, no século XVII. Aborda a questão da lealdade e da traição, numa clara alusão à conjuntura política do período em que foi escrito. Inclui canções famosas de Chico Buarque, como Anna de Amsterdã e Bárbara.
Com sensibilidade e inteligência, a peça amplia o debate ideológico de forma provocativa, irônica, quase caricatural. Os conceitos de traidor e traição, se subjetivos per se, tornam-se ainda menos palpáveis na obra de Chico e Ruy. Afinal, onde está a traição: nos mantenedores da ordem ou na rebeldia dos heróis? E quem são, de fato, os heróis e os vilões? Como escrevia Fernando Peixoto, em 1980, o texto de Calabar - o elogio da traição é "mal-comportado, e por isso estimula a elaboração de um espetáculo debochado, capaz de assumir a quase anárquica, mas organizada colagem e a justaposição de imagens e épocas".
Com Calabar - o elogio da traição, visam divertir o público, espalhando pontos de interrogação, dúvidas e perplexidades. Surpreendendo pelo atualizado deboche crítico, fundamentado num confronto realista com temas essenciais de nossa existência de nação social-econômica-política- culturalmente ainda colonizada num tímido mas empenhado esforço de construção de uma democrática cultura nacional-popular.
Há sensibilidade e inteligência na utilização da matéria histórica como instrumento capaz de instaurar uma conseqüente reflexão que ultrapassa os limites de determinadas circunstâncias político-econômicas e amplia o debate ideológico de forma irônica, provocativa, apoiada em extrema e contagiante teatralidade, usando a postura crítica e a desmedida coragem de assumir o grotesco. A obra desmistifica o conceito de traidor e a noção vazia e abstrata de traição.
Texto escolhido
"E se vocês rirem de mim,
Se eu for alvo de chacotas e chalaças,
Se for ridículo na jaqueta de veludo
Ou nas ceroulas de brim,
Ou porque falo tanto de caganeira e bacalhau,
É bom pensarem duas vezes, porque, ainda mesmo assim,
Com lombrigas dançando dentro da barriga,
Com a Holanda, a Espanha e toda a intriga,
Eu sou aquele que, custe o que custar,
Acerta o laço e tece o fio
Que enforca Calabar."
Nenhum comentário:
Postar um comentário