Guedes de Miranda
Divaldo Suruagy
07 de Novembro de 2012
Jurista,
político, jornalista, escritor, poeta, administrador, tudo isso, em
alta expressão, inspirou Jayme de Altavila a dizer sobre sua singular
trajetória: “Encheu todo o seu tempo com o vigor de sua personalidade
marcante. Era, sem favor, a maior expressão intelectual das Alagoas”.
Por sua vez, Osman Loureiro asseverou: “Guedes de Miranda foi o maior
tribuno das últimas gerações de alagoanos”.
A
cultura múltipla e marcante que possuía, fez com que, inclusive, se
relegasse ao esquecimento o seu trabalho como administrador. Na
realidade, quando Interventor Federal, Guedes de Miranda teve atuação
profícua. Realizou diversos Congressos de Prefeitos, estudando os
problemas das municipalidades. Conseguiu a dragagem do São Francisco,
nas imediações de Penedo, e a volta dos navios Loide Brasileiro àquele
rio. Construiu a rodovia Penedo/Piaçabuçu, passando pelo Vale de
Marituba. A seu crédito, existem, ainda, a construção do Jardim Infantil
Ismar de Gois Monteiro, do Salão da Biblioteca do Tribunal de Justiça,
as reformas do Hospital Santa Leopoldina, do Liceu Alagoano, do Colégio
Moreira e Silva e do Teatro Deodoro.
Jornalista
distinto, esteve presente, com brilhantismo, nas páginas do Jornal do
Comércio, Diário do Povo, Jornal de Alagoas e Diário de Alagoas. Neste
último, foi o editorialista contundente durante o Governo Muniz Falcão.
Belo
espetáculo das manifestações de inteligência, cultura e criatividade de
Guedes de Miranda foi o Tribunal do Júri, onde seus debates, com
Rodriguez de Melo, ficaram famosos. A participação desses dois gigantes
lotava os locais dos julgamentos. Um público atento, ávido das
demonstrações de saber jurídico, acompanhava as orações dos contendores.
O
pensamento de Guedes de Miranda está sintetizado numa frase que ele
pronunciou, quando da Oração da Democracia, no dia sete de setembro de
1943: “Atenas amou a sabedoria e a beleza, mas amou, sobretudo, a
liberdade”.
Em
“Eu e o Tempo”, registra o seu primeiro encontro com a realidade,
naquele 16 de maio de 1886, quando, ao meio dia, sob o toque dos sinos
da Matriz de Porto Calvo, estremecendo a cada badalada, nasceu o futuro
grande tribuno. Começava, então, uma trajetória luminosa, repleta de
realizações políticas e culturais, só encerrada em primeiro de agosto de
1961, quando a alma do poeta buscou o seu lugar na amplidão.
Interventor
Federal, Vice-Governador, Procurador Geral do Estado, Secretário do
Interior, Diretor do Liceu Alagoano e da Faculdade de Direito, advogado
famoso, em toda a gama imensa de sua atividade, Guedes de Miranda foi,
invariavelmente, a grande dimensão humana de todas as horas.
Foi um dos fundadores da Academia Alagoana de Letras e honrou o quadro de sócios do Instituto Histórico de Alagoas.
De
sua bibliografia constam títulos como “Minha Fé no Direito”, “Elogio do
Gênio e outros Discursos”, “Exaltação à Terra e a Sua Gente”,
“Holandeses em Porto Calvo”, “Antes que Desça a Noite” e “Eu e o Tempo”.
Um
aspecto da personalidade de Guedes de Miranda que enriquece o seu
espírito é a sua capacidade de perdoar, de esquecer as ofensas, de
reconsiderar posições. Havendo, no início de sua carreira, feito sérias
acusações ao Governador Fernandes Lima, teve a coragem moral de se
retratar, tempos depois, afirmando “Equivoquei-me. Escuso-me dessa
injustiça com a humildade de quem quer se penitenciar de um pecado”.
Conheci-o,
apresentado por meu pai, à porta do Cinearte, depois Cine São Luiz, na
Rua do Comércio, em Maceió. Alto, robusto, cabelos brancos, transmitia
uma imagem de força e autoconfiança. Deixei-me cativar por sua
personalidade dominadora. Fui seu eleitor quando disputou uma cadeira no
Senado da República. Embora tenha exercido importantes cargos políticos
no cenário alagoano, sempre o considerei mais o mestre, o intelectual
do que o militante da política.
O
lirismo da poesia do Velho Guedes é a marca registrada de seu estro. No
poema “Tolice” ele se reflete de maneira delicada, repleta de beleza:
“Mandei caiar o meu quarto de dormir/para apagar das paredes a tua
sombra/. Tolice. Ela se escondeu invisível na minha saudade”. Alagoas
tem, em Guedes de Miranda, uma luz de sapiência, portadora da mensagem
eterna de grandeza.
Antes que desça a noite
.
Guedes de Miranda
.
Antes que desça a noite,
O sol se pondo,
Contemplo em paz o fim da minha tarde.
Recordo o que fui – vencendo o tempo
Percebo o que sou – pelo tempo vencido.
Lutei, sofri, amei – vivi
E, com certeza, morrerei.
A ninguém, neste mundo, posso dizer
Fiz mal.
Quando a noite ontológica, implacável, descer,
Que restará de mim?
– Estes pobres poemas largados à toa:
Minh’alma dançando a valsa das sombras
E palavras, palavras...
E o fim, nada mais.
.
Guedes de Miranda
.
Antes que desça a noite,
O sol se pondo,
Contemplo em paz o fim da minha tarde.
Recordo o que fui – vencendo o tempo
Percebo o que sou – pelo tempo vencido.
Lutei, sofri, amei – vivi
E, com certeza, morrerei.
A ninguém, neste mundo, posso dizer
Fiz mal.
Quando a noite ontológica, implacável, descer,
Que restará de mim?
– Estes pobres poemas largados à toa:
Minh’alma dançando a valsa das sombras
E palavras, palavras...
E o fim, nada mais.
Ciúme
Guedes de Miranda
A tua sombra procurou-me aflita
e me disse em pranto:
– Tenho ciúme de ti, amigo,
porque o meu corpo está fugindo de mim
para ficar contigo.
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