sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Túneis mexem com imaginário do povo em Porto Calvo - Professor Aloísio Vilela de Vasconcelos

TÚNEIS. Livros publicados no século 17 fazem menção às estruturas durante as invasões holandesas. 

Professor Aloísio Vilela de Vasconcelos da Ufal defende estudo

Por: SEVERINO CARVALHO - REPÓRTER - Fonte: Gazeta de Alagoas

Na edição de domingo, 8 de julho, o caderno de Municípios da Gazeta de Alagoas publicou reportagem acerca da possível existência de túneis que cortariam o subsolo da histórica cidade de Porto Calvo. As estruturas subterrâneas teriam sido construídas no século 17 e serviriam às fugas dos exércitos luso-espanhol e holandês, que disputavam a posse do território. 


Antigos moradores entrevistados pela Gazeta garantiram que os túneis existem e que, até, já vislumbraram suas entradas, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação e no Alto da Forca; bem como suas saídas, que estariam submersas pelas águas do Rio Manguaba. 



Em contrapartida, o arquiteto e urbanista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Alagoas (Iphan), Sandro Gama, sentenciou que não existe, na historiografia da arqueologia brasileira, nenhuma comprovação acerca da existência de túneis de fuga/abastecimento usados durante as batalhas.



Eis que surge uma voz no meio acadêmico que levanta-se para dizer que há sim, na historiografia, referências e alusões aos tais túneis misteriosos de Porto Calvo. Trata-se do professor de arqueologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Aloísio Vilela de Vasconcelos.





“Depois da reportagem, andei vendo alguns livros em minha biblioteca. Verifiquei que há sim referência à existência dos túneis”, afirmou o professor. E, como comprovação, cita duas obras publicadas no século 17: Memórias Diárias da Guerra do Brasil, de Duarte de Albuquerque Coelho (1654), e o Valeroso Lucideno, do frei Manuel Calado (1648).



No primeiro livro, explica Vasconcelos, há diversas referências sobre alocalização de construções situadas no outeiro de Amador Alvres, nas proximidades da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação. Esse outeiro (pequeno monte) estaria “a tiro de canhão” da povoação, conforme a obra de Duarte Coelho. 



Vasconcelos relata que o Outeiro de Amador Alvres é citado como reduto usado pelas tropas de Matias de Albuquerque que ali encontraram abrigo durante o “Êxodo Pernambucano” para o sul, quando as tropas holandesas tomaram o Forte Real de Bom Jesus. “O outeiro assume papel importante. Todos os cronistas da guerra falavam dele”, destacou. 



Em o Valoroso Lucideno, porém, há a referência mais clara, na ótica de Vasconcelos, acerca da existência dos túneis. Trata-se de uma passagem em que frei Manuel Calado, fala da fuga do Conde de Banholo de Porto Calvo, cercada pelos holandeses.



“O padre se refere que o conde de Banholo teria saído por um caminho secreto, na sua fuga, acossado pelas tropas holandesas comandadas pelo conde João Maurício de 



Nassau”, detalha o professor.



“Como ele se refere a caminho secreto, então o que significa caminho secreto? É um caminho que você passa por ele e ninguém vê. Que você o percorre e não é pressentido e isso dá a ideia da existência de um túnel, de uma saída de emergência”, conclui Vasconcelos, que defende, na atualidade, um estudo mais aprofundado sobre o assunto.



“Qual a função da ciência? A procura da verdade. Se existe alguma referência sobre a existência de túneis, cabe aos pesquisadores averiguar se essa referência é verdadeira”, disse. ‡ 




PORTO CALVO. Antigos moradores defendem estudo aprofundado
Túneis mexem com imaginário do povo
Por: SEVERINO CARVALHO - REPÓRTER
Porto Calvo – Na histórica Porto Calvo, berço de Domingos Fernandes Calabar, primeiro herói e idealista brasileiro dos anos seiscentistas, um grupo de adolescentes indignados com uma atitude do padre e professor planeja se vingar. Numa Sexta-Feira Santa, eles invadem a sacristia para esconder os vinhos e hóstias. Só que não contavam que tal atitude os levaria a cair misteriosamente numa passagem secreta subterrânea que há mais de três séculos permanece inexplorada e servia a fugas estratégicas dos holandeses contra os luso-espanhóis. Lá dentro, dentre tantos mistérios, suspenses e surpresas, ficam cara a cara com a serpente adormecida. 


Essa é a apresentação do livro A Serpente Adormecida (2011) da escritora alagoana Marluce Maria da Costa. A obra é de ficção; porém, lastreada por fatos históricos que dão vida à narrativa. Que a tal víbora não existe, todos concordam. A figura do monstro integra o imaginário popular da cidade, é tratada como lenda: se surgir em público, Porto Calvo desaparecerá sob as águas turvas do caudaloso Manguaba. 



O que antigos moradores, dentre eles escritores e professores, tratam como não ficção é a existência do habitat da serpente: túneis escavados no século 16 pelos portugueses ou holandeses (não existe um consenso acerca da autoria) e que serviam à logística da guerra, como também eram utilizados como rota de fuga ante as intensas refregas entre os exércitos adversários. O certo é que, mesmo depois de reformas executadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) na igreja tombada de Nossa Senhora da Apresentação, erigida em 1610, nenhum vestígio das passagens secretas fora encontrado até agora. 



Crentes na existência de tais estruturas, um grupo de portocalvenses defende um estudo mais aprofundado e específico por parte do Iphan para desenterrar a história e trazê-la aos olhos dos incrédulos. O caminhoneiro aposentado Amaro de Lima, 59 anos, é um deles. Não inspirou a escritora a desenvolver um dos personagens do livro, mas bem que poderia. Quando adolescente, conta que chegou a descer alguns degraus que levavam ao túnel. O medo o fez recuar.



“Eu sabia que a serpente não estava lá. Tinha, na verdade, muito escorpião, muita poeira. Tive medo da escuridão e voltei”, recordou. Na época, quem administrava a igreja com mãos de ferro era o padre Expedito Barbosa. Amaro vivia em volta do templo católico a brincar. A distração predileta era exterminar morcegos a “tiros” de estilingue e, quando o vigário dava um vacilo, lá ia o moleque procurar o tesouro perdido dentro do túnel. Conta a lenda que as relíquias em ouro e prata eram vigiadas pela temida serpente.


“Eu era um garoto travesso, mexia com tudo em Porto Calvo”, relembra o aposentado. Hoje, saúde combalida e uma caixa abarrotada de remédios sobre a mesa. Amaro segue narrando sua epopeia. Ele não desistira da empreitada e equipara-se com vestimenta adequada e um capacete daqueles usados por exploradores de cavernas: lanterna no alto da cabeça. “Eu já tinha uns 17, 18 anos e me preparei. Lembro que o comentário na rua era um só: ‘é hoje que o Amaro vai entrar’. Lá em casa, a choradeira era grande para eu não entrar. Mas o padre não deixou nem eu entrar”, recordou Amaro. ‡

Ex-prefeito da cidade nega ter fechado acesso à rede subterrânea
Consultado acerca do suposto pedido feito pelo então padre de Porto Calvo Expedito Barbosa para que fechasse a entrada do túnel que existiria na sacristia da Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, o ex-prefeito Zaronir Ramalho foi enfático ao afirmar que tudo não passa de lenda.

“Não há nada de concreto. Estive lá na igreja para ver e não tem nada”, disse Zaronir, negando ter bloqueado a passagem. Natural de Jacuípe e vivendo hoje em João Pessoa (PB), a escritora e professora Marluce Maria da Costa acredita na existência da rede de túneis. “Desde pequena, ouço falar disso, inclusive vi uma das entradas. A da igreja fica na sacristia. Falei com o padre Expedito, mas ele desconversou”, lamentou a escritora.

Ela relata que o livro é uma mistura de ficção, história e lenda, mas que o ambiente escuro e lúgubre onde viveria o réptil é real. O professor de História Amaro Petrúcio Oliveira, 59, é outro que atesta a existência dos túneis. Porém, segundo o mestre portocalvense, não havia conexão entre eles. 

“Eram dois túneis independentes. Um saía da igreja em direção ao Rio Manguaba e outro saía do Alto da Forca, atual hospital, seguindo até o rio na altura do Bairro do Curi. Todos, porém, estão com suas entradas bloqueadas”, lamentou o professor, que leciona no município de Porto Calvo. SC ‡

ALERTA. Professor diz que poderá haver conflito entre a história imaginada e a realidade

Inexistência pode afetar folclore
Por: SEVERINO CARVALHO - REPÓRTER
Porto Calvo - O professor Scott Joseph Allen, coordenador do Núcleo de Ensino e Pesquisa Arqueológica (Nepa) da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), teme que uma pesquisa arqueológica em busca  dos túneis, escavados supostamente durante as invasões holandesas, acabe afetando o patrimônio imaterial de Porto Calvo, ou seja, todo o folclore que envolve essas estruturassubterrâneas. 


Ele vislumbra que poderá haver um conflito entre a história imaginada e a real se a pesquisa for levada à frente.



"Há, na história da colonização das Américas, evidências da existência de túneis usados, entre outras coisas, como rota de fuga. Mas em Porto Calvo, não posso afirmar. Se um trabalho arqueológico vier a descobrir a existência dos túneis, ótimo; mas e se não existirem, como fica?", ponderou o professor.



ROTA



Scott esteve em Porto Calvo, em anos anteriores, durante sondagens feitas para o Projeto Rota da Escravidão/Rota da Liberdade: A Arqueologia Histórica da Diáspora Africana em Alagoas, que vai ingressar na segunda fase. 



Naquelas ocasiões, Scott ouviu inúmeros relatos da população sobre a existência dos túneis, mas a pesquisa feita por ele não tinha relação com este tema especificamente. 



"A verificação da existência dos túneis, enfatizada muitas vezes pela população, é algo que me deixa com um pouco de receio, pois me parece que a arqueologia pode, de certa forma, afetar parte do folclore de Porto Calvo, lendas que têm lugar importante no imaginário dos habitantes e para os visitantes", observou, enfatizando que só a comunidade local pode decidir sobre a realização ou não de uma pesquisa em busca dos túneis. 



O arqueólogo considera, ainda, que a história de Porto Calvo ficou à sombra da história de outros centros coloniais, tais como Recife, Penedo e Salvador, na Bahia. Lembra, também, que a região banhada pelo Rio Manguaba foi um dos berços da produção açucareira em terras alagoanas logo após a colonização da Capitania de Pernambuco, cenário importante da ocupação holandesa e reconquista pelos portugueses.




Professor propõe educação patrimonial
O professor Scott conta que a região de Porto Calvo foi desenvolvida inicialmente por volta de 1580, por Cristóvão Lins, que recebera uma grande sesmaria que se estendia do Porto de Santo Agostinho, em Pernambuco, até o Rio Camaragibe, em Alagoas. Ele acredita, entretanto, que a arqueologia de Porto Calvo representa uma oportunidade inédita de aprofundar o conhecimento da época colonial em Alagoas.

"Teremos, eventualmente, acervos de materiais arqueológicos - como cerâmica importada e de fabricação local - que auxiliarão na interpretação de diversas comunidades periféricas. O Projeto Rota da Escravidão/Rota da Liberdade fornecerá dados imprescindíveis para o conhecimento da diáspora africana em Alagoas", considerou.

Para ele, grande desafio será, porém, a implantação de um programa de educação patrimonial, não voltado para colocar em questão as lendas, mas para para orientar o público sobre os limites e possibilidades da arqueologia. 

O lotérico Adelmo Monteiro defende a busca pelos túneis. "Eu comecei a me interessar pela história de Porto Calvo depois que saí do antigo Produban (extinto banco do Estado) e montei uma pizzaria.

Os turistas chegavam falando e perguntando sobre a história de Porto Calvo. Ficavam tristes porque, além da igreja, não tinha nada para ver. A descoberta desse túnel pode alavancar o turismo histórico em Porto Calvo, basta as autoridades se interessarem em fazer um trabalho arqueológico", propõe Monteiro. SC ‡




TÚNEIS. Livros publicados no século 17 fazem menção às estruturas durante as invasões holandesas
Professor da Ufal defende estudo
Por: SEVERINO CARVALHO - REPÓRTER
Na edição de domingo, 8 de julho, o caderno de Municípios da Gazeta de Alagoas publicou reportagem acerca da possível existência de túneis que cortariam o subsolo da histórica cidade de Porto Calvo. As estruturas subterrâneas teriam sido construídas no século 17 e serviriam às fugas dos exércitos luso-espanhol e holandês, que disputavam a posse do território.

Antigos moradores entrevistados pela Gazeta garantiram que os túneis existem e que, até, já vislumbraram suas entradas, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação e no Alto da Forca; bem como suas saídas, que estariam submersas pelas águas do Rio Manguaba. 

Em contrapartida, o arquiteto e urbanista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em Alagoas (Iphan), Sandro Gama, sentenciou que não existe, na historiografia da arqueologia brasileira, nenhuma comprovação acerca da existência de túneis de fuga/abastecimento usados durante as batalhas.

Eis que surge uma voz no meio acadêmico que levanta-se para dizer que há sim, na historiografia, referências e alusões aos tais túneis misteriosos de Porto Calvo. Trata-se do professor de arqueologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Aloísio Vilela de Vasconcelos.



“Depois da reportagem, andei vendo alguns livros em minha biblioteca. Verifiquei que há sim referência à existência dos túneis”, afirmou o professor. E, como comprovação, cita duas obras publicadas no século 17: Memórias Diárias da Guerra do Brasil, de Duarte de Albuquerque Coelho (1654), e o Valeroso Lucideno, do frei Manuel Calado (1648).

No primeiro livro, explica Vasconcelos, há diversas referências sobre alocalização de construções situadas no outeiro de Amador Alvres, nas proximidades da Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação. Esse outeiro (pequeno monte) estaria “a tiro de canhão” da povoação, conforme a obra de Duarte Coelho. 

Vasconcelos relata que o Outeiro de Amador Alvres é citado como reduto usado pelas tropas de Matias de Albuquerque que ali encontraram abrigo durante o “Êxodo Pernambucano” para o sul, quando as tropas holandesas tomaram o Forte Real de Bom Jesus. “O outeiro assume papel importante. Todos os cronistas da guerra falavam dele”, destacou. 

Em o Valoroso Lucideno, porém, há a referência mais clara, na ótica de Vasconcelos, acerca da existência dos túneis. Trata-se de uma passagem em que frei Manuel Calado, fala da fuga do Conde de Banholo de Porto Calvo, cercada pelos holandeses.

“O padre se refere que o conde de Banholo teria saído por um caminho secreto, na sua fuga, acossado pelas tropas holandesas comandadas pelo conde João Maurício de

Nassau”, detalha o professor.

“Como ele se refere a caminho secreto, então o que significa caminho secreto? É um caminho que você passa por ele e ninguém vê. Que você o percorre e não é pressentido e isso dá a ideia da existência de um túnel, de uma saída de emergência”, conclui Vasconcelos, que defende, na atualidade, um estudo mais aprofundado sobre o assunto.

“Qual a função da ciência? A procura da verdade. Se existe alguma referência sobre a existência de túneis, cabe aos pesquisadores averiguar se essa referência é verdadeira”, disse. ‡ 



Porto Calvo/AL - De peça em peça, grupo tenta reconstruir história

18/1/2006 - Defender




Correspondente Voluntária ETUR Gizelda da Silveira
Maragogi, cidade do litoral de Alagoas, que faz divisa com Pernambuco - Preocupado com a falta de registros da história de Porto Calvo, um grupo de moradores da cidade começa a reunir peças para a formação de um acervo destinado ao Museu Calabar. O resgate do personagem alagoano que teve sua trajetória deturpada pela versão oficial é considerado ponto de honra. Para tanto, tentam articular com órgão públicos e entidades culturais ações que resultem na recuperação de relíquias, na instalação do museu e retomada da auto-estima da comunidade por meio do conhecimento do seu passado.
Liderados pelo empresário Adelmo Monteiro, 48, dono de uma casa lotérica, empresários e profissionais liberais formam um reduzido grupo de pessoas que está aos poucos recolhendo peças que contam o passar do tempo na localidade considerada por alguns historiadores como a mais antiga de Alagoas. Polêmicas à parte, certo mesmo é que muitos objetos não se encontram mais na cidade. Alguns estão expostos em casas culturais de Maceió e do Recife, outros foram vendidos ou simplesmente doados para visitantes e colecionadores de arte da Bahia e do Rio de Janeiro, por exemplo.
Monteiro arruma sobre uma mesa em sua casa o que já conseguiu reunir para um dia expor ao público. São pedaços de tijolos pequenos, de cor amarelada, balas de canhão, moedas e um par de utensílios de cozinha, uma colher e um garfo com o símbolo do governo holandês, um cata-vento, e outra peça que ainda não se descobriu o uso. “Parte desse material foi doada por pessoas daqui mesmo e alguns eu mesmo consegui”, comentou com uma ponta de satisfação, convidando para ver outras investidas do grupo.
Ao lado do professor de História Amaro Petrúcio Oliveira Fereira, 52, parceiro no projeto de resgate do patrimônio histórico de Porto Calvo, Monteiro mostra o ponto que está sendo escavado na tentativa de localizar um dos túneis que serviram para fugas estratégicas dos perseguidos pelos invasores. O buraco aberto na cadeia abandonada da cidade ainda não possibilitou o encontro de alguma passagem subterrânea.
Apesar de o imóvel ser considerado “novo”, se comparado à história de Porto Calvo, ele representa bem a falta de preservação que praticamente eliminou da arquitetura urbana as marcas do passado. Depredado, restam apenas as paredes sem portas nem janelas. Sequer possui teto e apenas a grade de uma cela resiste à ação do tempo e dos vândalos. Adelmo conseguiu a chave para guardar no local as ferramentas usadas nos trabalhos de prospecção. Do lado de fora, o que restou das paredes serve de apoio para os varais de roupas das casas vizinhas.
Ignorado, patrimônio guarda relíquias de tempos remotos A tentativa de encontrar passagens que levem aos lendários túneis remetem à busca do Santo Graal, o cálice usado na última ceia de Jesus Cristo. Os registros históricos são incontestáveis. Resta encontrá-los. Sobre os subterrâneos, indícios de sua existência devem ser considerados, ainda mais quando se questiona como Calabar e cerca de 100 soldados holandeses teriam conseguido entrar na igreja matriz de Porto Calvo com a cidade tomada pelo exército luso-espanhol.
Usada como local de resistência durante 48 horas, a igreja onde provavelmente o filho da valente cidade foi batizado ou fez sua primeira comunhão serviu como pano de fundo para seu enforcamento sob o olhar da população. O julgamento sem direito à defesa condenou Calabar à morte, acusado de traição por entender que seria melhor para a então colônia brasileira ficasse sob o julgo do governo da Holanda ao invés da Coroa portuguesa.
Degraus em alguns pontos das margens do rio sugerem acessos às aberturas feitas às margens do Manguaba, única forma de os navios atingirem Porto Calvo. A lógica indica que a provável rede subterrânea ligaria setores estratégicos da cidade: a igreja matriz, uma construção registrada em uma gravura holandesa com sua base repleta de canhões - local da atual sede da 10ª Coordenadoria Regional de Ensino - e a fortificação existente no ponto mais alto da cidade, chamado erroneamente de “Alto da Forca” quando o correto é “Alto da Força” por causa da fortaleza militar erguida pela aliança entre portugueses e espanhóis.
O espaço privilegiado do ponto de vista militar é ocupado atualmente pelo Hospital Municipal, em reforma desde julho de 2005. Relatos indicam que durante sua construção, nos anos 40 do século passado, foram encontrados diversos objetos, a maioria doados pelo então prefeito Manoel Ferreira de Barros. Parte desse acervo, inclusive “restos de fardamentos”, está em exposição na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, em Maceió, de acordo com Adelmo Monteiro. Entradas de túneis foram irremediavelmente lacradas com a construção da unidade de saúde.
Vizinho ao hospital, já nos anos 70, foi erguido outro prédio para serviços de saúde pública. Durante os serviços, novas descobertas aconteceram e mais uma vez desperdiçadas com doações para particulares da cidade e de outros locais. O patrimônio de Porto Calvo escorria como areia fina entre as mãos dos que não percebiam a importância de manter no município as relíquias de sua própria história.
De Zumbi a Calabar, templo é referência O templo que homenageia atualmente Nossa Senhora da Apresentação tem em sua fachada a inscrição com o ano de 1610. Para Audemário Lins, autor de obras sobre Calabar e Zumbi dos Palmares, a cartela indica o término de sua construção. Ele acredita que o começo da obra deve ter ocorrido em 1597, corrigindo uma informação passada aos turistas e estudantes quanto ao significado do registro. Sobre a versão de que o herói negro Zumbi dos Palmares tivesse sido coroinha da igreja, Audemário diz que não encontrou em suas pesquisas registro que atestasse a suposição. Ele acredita que “Zumbi, uma criança escrava, deve ter feito serviços de limpeza na igreja para o padre”.
As observações feitas por Audemário, mais conhecido por Calabar por causa de sua dedicação à vida do conterrâneo, são frutos de “muitas horas de leitura” que lhe renderam 6 graus em cada lente dos óculos. Cansado, garante ter concluído a última investida sobre a vida do mulato filho de uma índia e de pai desconhecido. Trata-se do original ainda sem previsão de publicação intitulado “Tributo a Calabar e Arciszewiski”, este um oficial polonês que lutou ao lado do brasileiro a serviço do príncipe Maurício de Nassau.

Comentários sobre a matéria: Para quem não sabe, Cabalar é uma figura que se   destacou na história pátria colonial durante a época da invasão dos holandeses no Nordeste (1630-1654). Morador de Porto Calvo, Alagoas, passou para o lado holandês em 1632. Consequentemente, é desprezado pela maioria das pessoas como traidor. Mas, nos peruntamos: A quem Calabar traiu? Ele não traiu o Brasil, pois naquela época o Brasil ainda não era uma pátria. Muitos defensores de Calabar o defende dizendo que ele fez o que era melhor para o Brasil.
A iniciativa de Maragogi  é muito importante, pois estão tentando resgatar a base histórica de Porto Calvo e é a população quem está a frente de tudo isso.



Vale lembra......



A origem é lendária. Dizem que antes da chegada de Cristóvão Lins para assumir as terras que ganhara da Coroa, às margens do Rio Manguaba, um velho calvo morava nas redondezas. O Porto do Calvo ficou conhecido desde então.  Quando a povoação se consolidou, após a criação dos primeiros engenhos, foi elevada à vila com o nome de Bom Sucesso, em regozijo à vitória obtida contra os holandeses. Mais adiante, foi denominada Santo Antônio dos Quatro Rios, devido aos cursos d`água que a rodeiam. Todavia, a denominação original prevaleceu arraigada que estava no coração de sua gente.

História - Quem quer que passe pela estrada litorânea que liga Alagoas a Pernambuco, viajando de Maceió, na região balizada por morros e rios, antes de Japaratinga e Maragogi, avista uma cidade que imediatamente traz recordações de grandes acontecimentos históricos. Desde a fase da expansão dos engenhos, passando pelo período de domínio holandês, ela esteve indelevelmente ligada à história do Nordeste e do Brasil. Parecerá ao viajante ouvir ruídos e vozes distantes, falas estranhas e ininteligíveis de índios, portugueses, negros, espanhóis e flamengos com seus desejos, medos e ambições. Tantos personagens, tantas emoções, que essa pessoa será levada a concluir que ali há um túnel do tempo, outra dimensão ou um museu invisível.

Na bandeira e no brasão de Alagoas, somente ela e mais duas cidades têm o privilégio de ter o seu escudo colocado em realce. Herança da engenharia heráldica holandesa, o primitivo brasão foi idealizado por Maurício de Nassau, que reconheceu a sua importância e destacou os três morros postos em faixa, típico de sua formação montanhosa. Para diferenciá-los do antigo símbolo holandês, nossa bandeira e brasão atual trazem quatro faixas ondadas de azul que representam os quatros rios dali: o Tapamundé, o Moicatá, o Comandatuba e o Manguaba, alusão ao antigo nome da sesmaria doada a Antônio de Barros Pimentel, que era chamada de Santo Antônio dos Quatro Rios.              

Renomada por sua antigüidade e por feitos imorredouros ao longo de sua trajetória colonial, a segunda cidade mais antiga do estado edificou-se a partir de uma sociedade patriarcal voltada para a cultura da cana-de-açúcar, com a hegemonia de um patriciado rural sustentado pelo trabalho escravo. Avulta nela a grande propriedade, que tinha o engenho bangüê como centro e a capela e a senzala como elementos indispensáveis ao projeto de colonização, implantado de forma autoritária para os índios que viviam no local antes da chegada dos portugueses e dos negros africanos trazidos à força de sua distante terra. Posto intermediário onde se detinham os que vinham da sede da capitania em demanda a Alagoas do Sul e ao seu ponto extremo, Penedo do São Francisco, tinha Porto Calvo base populacional expressiva de mulatos, resultante dos cruzamentos entre os brancos senhoriais e os negros mantidos em servidão nos numerosos bangüês existentes em sua área geográfica. Calabar, ícone da região e uma das figuras mais controvertidas da história brasileira, é um exemplo de mulato, filho de senhor de engenho e escravo, o que explica muitos fatos de sua vida, seu comportamento e o desejo de independência e respeito pessoal.

Duarte Coelho já teria percebido o valor estratégico da localidade quando percorreu sua capitania costa abaixo, “entrando nos portos todos de seus domínios”. As diversas tentativas de estabelecer um posto avançado de Olinda só se concretizariam quando Cristóvão Lins, a mando de Jerônimo de Albuquerque, novo donatário, substituindo sua irmã, que falecera, percorreu o litoral chefiando uma bandeira. Esta bandeira combateu os índios, resistentes encarniçados ao projeto de colonização, e lhes tomaria as terras para o plantio de cana-de-açúcar. Como prêmio ao sucesso de sua cruzada, Cristóvão Lins recebeu a vasta sesmaria que ia da foz do Manguaba até o cabo de Santo Agostinho.

Casado com D. Adriana de Holanda, o nobre florentino fez prosperar a sesmaria e edificou sete engenhos e uma capela, desenvolvendo a agricultura, tornando-se o pioneiro da indústria açucareira, após expulsar os potiguaras. Recebeu o título de alcaide-mor. Iniciara-se a colonização. 

Dirceu Lindoso opina que, embora ela seja a segunda povoação mais antiga, depois de Penedo foi, no entanto, a primeira comunidade política estabelecida na parte austral de Pernambuco e que “de uma fortaleza militar, ela evoluiu para uma cidade defendida e depois para o centro político principal da Alagoas Boreal”. A ocupação da colina, segundo ele, foi antes um ato militar. Se o patriarca Cristóvão Lins ficou para estabelecer as bases do povoamento, responsável pelos primeiros engenhos que fizeram florescer o valioso burgo, a partir de 1560 coube ao seu neto, o jovem Cristóvão Lins de Vasconcelos, se eternizar quando das lutas de restauração contra os holandeses, liderou seus habitantes contra os invasores dos Países-Baixos. A consolidação do novo centro econômico, político e militar da capitania foi ameaçada por lutas e revoltas ao longo do tempo, uma delas nesse período.

Sua bravura foi cantada por Frei Manoel Calado, entusiasta da expulsão dos flamengos, de língua diferente e religião inimiga da Igreja Católica. No livro “O Valoroso Lucideno”, espécie de Ilíada dos portugueses que, claro, dá versão portuguesa e maniqueísta do conflito, há a seguinte estrofe:

“Não me posso escusar de dar louvor
A um mancebo de tão tenra idade.
Com quem o esforço, o brio e o valor
Confirmam da nobreza a qualidade.
Foi desta povoação descobridor:
Cristóvão Lins, exemplo de bondade.
Porém se pelo avô foi conquistada.
Também foi pelo neto restaurada.”

A restauração de Porto Calvo, como a de Penedo, foi um marco divisor da guerra, interrompendo a gangorra de vitórias e derrotas de ambos os lados. A comoção causada pela prisão pelos batavos do fidalgo portocalvense Rodrigo de Barros Pimentel, casado com dona Jerônima de Almeida, matriarca de grande prestígio, e a aliança de Cristóvão Lins com Vasco Marinho Falcão, encorajou os habitantes da vila ao enfrentamento decisivo, atraindo gente de todos os lugares da região, armada com espingardas, dardos, espadas, paus, facões, foices, arcos, flechas e todo tipo de arma disponível. Um barco holandês conduzindo víveres e munições foi capturado no Rio Manguaba. Após 42 dias de sítio, a cidade foi retomada pelos nativos. Em 17 de setembro de 1645, o pavilhão flamengo foi arriado sob o olhar pesaroso do coronel Calram Florins e substituído pelo pavilhão dos quinas, como eram chamados os restauradores.

Naqueles dias incertos e tempestuosos, imortalizavam-se pelo heroísmo demonstrado nas batalhas as figuras de Felipe Câmarão, sua mulher dona Clara Camarão, Henrique Dias, Jerônimo de Albuquerque e o mais controvertido deles, Domingos Fernandes Calabar, considerado pelos portugueses um traidor, e por muitos historiadores um herói.

Detentor de incrível coragem e conhecedor do terreno, Calabar mudou o curso da guerra ao escolher as hostes holandesas. Traído por um morador, entregou-se durante o cerco à cidade para poupar seus novos companheiros. Foi enforcado e esquartejado em sua cidade natal, onde hoje é glorificado. Chico Buarque de Holanda escreveu um trabalho sob o sugestivo título de “Elogio da Traição”. Há vários livros sobre o tema, como “Calabar, o Patriota”, de Hercules Pinto, e a significativa frase de José Bonifácio, o Moço: “A quem traístes, herói?”.

Outro fato que merece registro na cidade são as passagens dos visitadores do Santo Ofício, perseguindo pessoas por heresia e comportamento inconveniente. Há alguns casos de denúncia de portocalvenses que redundaram em duras penas da terrível Inquisição, em Lisboa. Também merece menção o papel desempenhado pela povoação, no Século XVII, por ocasião dos ataques à fortaleza do Quilombo dos Palmares, pois era lá a base onde se concentravam as forças reais que partiam na tentativa de destruir a famosa cidadela da liberdade.

De lá saíram, por exemplo, em 1677, a primeira expedição chefiada pelo sargento-mor Manoel Lopes Galvão, e a do capitão Fernão Carrilho, que por ter vencido pela primeira vez os denodados negros, imaginou erroneamente que tinha acabado com a chamada Tróia Negra. Ainda podemos assinalar no Século XIX sua participação nos movimentos da independência, com a criação da primeira junta governativa emancipadora, sua presença no movimento revolucionário de 1824, na Guerra dos Cabanos, de 1831 a 1834, e ainda, na Revolução Praieira, de 1848 e 1849.

Fonte: Enciclopédia Municípios de Alagoas


Um comentário:

“Viver é uma arte. E seu roteiro deve ser escrito pela sabedoria e pelo bom senso”. Dr. José Reginaldo de Melo Paes (medico, poeta, acadêmico alagoano)

  Dr. José Reginaldo de Melo Paes (medico, poeta, acadêmico alagoano) “Viver é uma arte. E seu roteiro deve ser escrito pela sabedoria e p...