O ZIGUEZIGUE
Logo
após o último carnaval estava, à noite, em um “canto chorando o meu pranto” num
dos ambientes de meu refúgio de Viçosa quando, de repente, entra um ziguezigue
que, após rodopiar como um desesperado a procura do caminho de entrada, que o
levaria para fora de sua “prisão”, pousa, barulhentamente, sobre o abajur e se
acalma.
O
fato além de me deixar pensativo, chamou de tal modo minha atenção que me fez esquecer
por completo meus densos e interrogativos pensamentos de pouco antes e fixar
minha atenção, unicamente, no seu interessante e misterioso aparecimento.
Ora,
todos sabem que o ziguezigue é uma criatura do ar, amante do campo, das plantas
e, principalmente, um exímio conhecedor da luz do dia. Portanto, acreditar que
a intensa luz branca do abajur o fez pensar que se tratava da brilhante luz do
sol, que se tratava, enfim, da liberdade e, por isto, se acalmou e nele pousou,
não passa de uma grande e tola ironia.
Por
que, então, um ziguezigue apareceu àquela hora da noite justamente onde me
encontrava?
Enquanto o olhava, pensava e pensava. Meus
pensamentos retrocederam, e muito. Viajaram para o passado. Lembrei de Casimiro
de Abreu. Lembrei da belíssima poesia “Meus Oito Anos”. Para mim, lembrar dessa
poesia é lembrar e, como num sonho, reviver os tempos da Mata Verde. Lembrei,
também, que lá corríamos atrás dessas libélulas e dos vaga-lumes. Que foi lá,
quando brincávamos no terreiro da Casa Grande de Elias Brandão Vilela, o “Capitão
Sinhô”, Senhor do Engenho Mata Verde “em assomos de fé, caridade e trabalho”,
nosso avô, em tempos em que todos nós éramos felizes, pois desconhecíamos a
palavra tristeza e desunião, que um de meus primos me botou o apelido de
ziguezigue.
Mas
isto explicaria sua presença naquele lugar àquela hora da noite? Não, claro que
não. Por que, afinal, ele veio me visitar?
Sei
que fatos estranhos acontecem e, para alguns, não há uma explicação racional. Quando
ocorrem, é para nos avisar de algo que ainda não temos a mínima consciência ou
para, propositadamente, nos chamar à realidade.
Não
tenho certeza, mas acredito que o ziguezigue, mesmo perdido e fora de seu
mundo, tenha me visitado para me lembrar e dizer que, apesar dos oceanos de
incertezas, amarguras e tristezas gratuitas que a vida oferece, “devo estar vivo
para as coisas que me deram vida”.
ARQUEÓLOGO
PROFESSOR DA UFAL
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