terça-feira, 15 de outubro de 2013

UMA RETÓRICA DE UMA CRIMINALIDADE ANUNCIADA - Carlos Henrique Palmeira Chaves



UMA RETÓRICA DE UMA CRIMINALIDADE ANUNCIADA


 Carlos Henrique Palmeira Chaves

            Vivemos em uma cidade cercada de belas praias, gente ordeira por natureza e um clima quente. É comum nos depararmos em sinais de trânsito crianças em idade terna pedindo em sinais com suas mãos pequeninas estendidas a para-brisas de carros. O triste disso tudo é constatar que essas crianças aprendem tal gesto antes mesmo de aprenderem a falar, de dominarem as primeiras letras. São gestos significativos de uma pobreza escandalizadora que reflete o abismo da desigualdade social que vive a nossa população. Somente aquele gesto das pequenas mãos estendidas próximas de nós é o prenuncio da marginalidade atroz. É a forma racional de entendermos o ser humano como um animal egoísta e presunçoso. Também se torna banal convivermos com a indiferença das elites oligárquica monocultora enraizada na “filosofia de vida” do mando e da subserviência, formadas por bases históricas desumanas através do trabalho negro escravo. Tais castas não se dão ao prazer de abrirem os vidros de seus cabriolés maravilhosos e sentirem o cheio da miséria do povo. Recentemente vi uma cena deprimente, encontrei dezenas de pessoas em um pátio escolar coberto, numa noite chuvosa e fria de março, estendidas no chão semi molhado, agrupando-se para pernoitarem no interior daquele moribundo templo do saber. O mais triste era ver aqueles homens, aquelas mulheres e crianças até de colo deitadas no chão esperando o crepúsculo do novo dia para tentar conseguir uma vaga para cursarem a alfabetização e de 1 a 4 séries do ensino fundamental, seus filhos, menores impúberes, filhos e filhas dos das Silva; não o Silva do presidente, que é chic, é emergente e está na moda. Conversando com a autoridade competente daquele núcleo educacional, descobri que era comum tal procedimento; e que, neste ano, as coisas estavam organizadas, pois ela teria feito um calendário determinando os dias dos pernoites, conforme o número de vagas. Fiquei estarrecido! Como pode o ser humano relegado à categoria de números, sobre dados de IDH. Lembrei-me das lições da velha ciência História: o ser humano já foi livre, nômade e coletivista; passou a ser escravos, objeto de outrem; libertou-se na antiguidade pelo Cristianismo para ser servo, servindo incondicionalmente em nome de Deus a seu Senhor; e se tornou, maravilhosamente, em números que podem ser ou não contabilizados em orçamentos públicos.  O que somos nós na verdade? Seres humanos que somos a imagem e semelhança de Deus ou seres de instintos racionalizados, mais bestiais nos sentimentos de amor e solidariedade ao próximo? Esta pergunta não teima em calar! Só há uma certeza dura e cruel. É uma retórica de uma criminalidade anunciada.

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