“Da favela a Alphaville”: memórias de migrantes alagoanos em Jurujuba, Niterói (RJ)
Paula Ritter*
Introdução
Este texto resulta de minha pesquisa de doutorado e visa analisar a trajetória de um grupo de migrantes alagoanos que se estabeleceu no bairro de Jurujuba no município de Niterói (RJ), durante os anos 1970 e 1980. Migrar, além da mudança geográfica, implica também adaptações e mudan- ças culturais. Ao efetivar o deslocamento para Jurujuba, o grupo estudado enfrentou dificuldades para se inserir no bairro, contudo admite que as opor- tunidades urbanas lhes possibilitaram a conquista de melhorias tanto em relação à vida que levavam antes de migrar quanto às situações vivenciadas logo após a chegada.
A expressão “Da favela a Alphaville”, utilizada nos relatos (em referência a condomínios de luxo em São Paulo), indica que o grupo conseguiu produzir seu próprio espaço, melhorando gradativamente a área ocupada em Jurujuba. Relativamente à análise da minha pesquisa, “Da favela a Alphaville” ainda significa o enfrentamento e superação das dificuldades no tocante às relações sociais que afetaram a identidade dos migrantes – identidade que foi sendo criada, ajustada e transformada ao longo do tempo em que estão no bairro.
Penna (1994, p. 17) indica que o processo migratório pode atuar como uma forma de destruir e recriar o modo de vida, as relações com o espaço, os referenciais simbólicos que marcavam a experiência social do migrante. Sendo assim, a identidade individual e coletiva pode ser reelaborada com os deslocamentos, com o estabelecimento de novas redes sociais e novas situa- ções/oportunidades surgidas no novo local.
Migrar para Jurujuba, lugar com características socioambientais que favoreciam atividades extrativas marinhas, possibilitou a participação do grupo em ocupações relacionadas às cadeias produtivas da pesca e da aqui- cultura. Estar em um centro de visibilidade internacional durante os prepara- tivos para a RIO-92 permitiu, ainda, que os migrantes se engajassem em um projeto articulado pelo governo estadual. Esse projeto, denominado Mexi- lhão Rio, visava o desenvolvimento comunitário por meio da formalização de uma associação e da adoção de práticas ambientalmente mais adequadas. Em termos ambientais, o projeto propunha a substituição da extração de mexi- lhões dos costões rochosos pelo cultivo desses organismos.
Os migrantes que se envolveram na proposta estariam, por um lado, reivindicando sua pertença a uma identidade coletiva e, por outro, estariam dando início a um movimento de reinvenção da diferença, modificando-a e atribuindo-lhe novos significados, como aponta Wieviorka (2005). Mesmo sendo uma proposta externa ao grupo, ela foi responsável por promover a inclusão social de seus membros através da organização comunitária e estí- mulo da mitilicultura (cultivo de mexilhões).
Os caminhos da pesquisa
Por meio das ferramentas da história oral foi possível reconstituir e registrar uma história que permanecia na memória dos migrantes; ousaria mesmo dizer documentar de que maneira se deu a inserção do grupo estudado em Jurujuba. As indicações de Halbwachs (1990) acerca da memória coletiva foram fundamentais para a análise empreendida neste artigo. O uso de tal proposição se justifica pelo fato do grupo analisado ter uma história comum, estar ligado territorial e socialmente desde a sua origem no Nordeste; esse fato articula de forma clara as noções de memória, espaço eidentidade.
As histórias de vida possibilitaram a obtenção de informações, mas, fundamentalmente, permitiram compreender as relações sociais (de
solidariedade, de trabalho, de dominação e de exclusão) que estavam em jogo tanto entre os membros do grupo estudado quanto entre o grupo e os demais moradores do bairro. Os depoimentos contribuíram para o entendimento da construção da memória individual e coletiva, fornecendo informações obje- tivas e subjetivas, a memória e as lembranças de cada entrevistado (Amado; Ferreira, 1996).
De acordo com Camargo (1984), o método biográfico é bastante indi- cado quando se estuda os processos migratórios. A autora assinala que, por meio da análise das histórias de vida, o pesquisador chega a uma maior con- sistência interna das informações, assim como a um maior controle das mes- mas, uma vez que, ao se complementarem, as diferentes versões podem ser relativizadas. Nesse sentido, Menezes (2002, p. 165, 167) afirma:
As histórias de vida revelam universos diversos e constituem, a nosso ver, um material rico para analisar como esta diversidade é elaborada por seus produtores [...]. Assim, o migrante avalia a sua trajetória de vida e nós pode- mos resgatar fatos, percepções, avaliações, perspectivas de vida, visões do mundo e opções do migrante.
Nesse sentido, as dificuldades que marcam a trajetória dos entrevista- dos, tanto no local de origem como na sua chegada ao bairro, estão presentes nas suas memórias, as quais foram acessadas através das histórias de vida, que ao se complementarem permitiram a compreensão do contexto histórico e social de existência do grupo.
Os acontecimentos que foram vivenciados pelo grupo estão gravados e são acessados porque são frequentemente retomados. Isso se daria, pois seus membros se apoiam na memória dos outros, confundindo seu passado com o passado do grupo do qual fazem parte (Bosi, 1983). Assim, a memória pode ser entendida como tentativa dos grupos de salvaguardar e reforçar sentimen- tos de pertencimento, de vínculo e de identidade, bem como de demarcar fronteiras sociais.
Em termos metodológicos, foram realizadas entrevistas semiestrutura- das, e a rede de entrevistados foi sendo constituída através das relações de proximidade (social e espacial) entre os próprios migrantes. Além do grupo de alagoanos, foram entrevistados moradores do bairro de Jurujuba que acompanharam a chegada do grupo. Durante as entrevistas, os relatos refleti- ram as percepções de cada entrevistado e sua “posição social” no grupo, pois
a memória coletiva depende tanto da interação e do testemunho quanto da estrutura social à qual pertencem/pertenceram os grupos e, nesse sentido, os indivíduos trariam para as interações presentes, posições adquiridas nesta estrutura (Santos, 2003). Assim, o que é lembrado não pode ser separado de como foi lembrado e de quem é/quem foi o sujeito que lembrou (Bosi, 1983; Halbwachs, 1990; Santos, 2003).
Após a etapa exploratória da pesquisa, optei por entrevistar inicial- mente as mulheres. Foram elas que mais apoiaram o trabalho nos primeiros momentos no campo, abrindo as portas da comunidade e incentivando que os homens concedessem entrevistas.
Iniciar as entrevistas pelas histórias de vida foi uma forma de valorizar cada entrevistado e também de minimizar algumas resistências que foram percebidas na fase exploratória. Tais resistências, especialmente por parte de alguns homens e de lideranças comunitárias, podem ter ocorrido por eu ser uma pesquisadora mulher em um universo ainda considerado masculino. Além disso, minha pesquisa se diferenciava das demais em andamento ou concluídas com o grupo, pois tinha como objetivo analisar o processo de migração e os mecanismos sociais adotados para se inserirem no bairro.
Os trabalhos anteriores consistiam em estudar aspectos do processo produtivo e dos padrões de qualidade do produto. Assim, alguns entrevis- tados afirmaram que já se sabia muito acerca do mexilhão e, portanto, no entendimento deles, esta pesquisa não resultaria em melhorias diretas no tra- balho e na produção de mexilhões. Contudo, no final da pesquisa de campo, um entrevistado verbalizou a importância de resgatar e documentar a histó- ria de sua comunidade.
Cabe dizer que apesar da autorização dos entrevistados para divulgar seus depoimentos optei por não identificá-los, buscando preservar sua iden- tidade. Além disso, os depoimentos utilizados para ilustrar este texto foram editados e corrigidos, sem, no entanto, desfigurar seu sentido e tom original.
Após esta introdução, é importante contextualizar as motivações que estimularam o grupo a migrar de Alagoas para o Rio de Janeiro e especifica- mente para Jurujuba. O texto segue com a análise de tensões objetivadas em função da sua origem, do local onde fixaram residência e do trabalho ao qual se dedicaram. Essa história permite revelar uma trajetória de luta, de conquis- tas e de transformação social.
O contexto da migração
O grupo estudado é proveniente de Alagoas, dos municípios de Jacu- ípe, Marechal Deodoro e Maceió. A vinda para o Rio de Janeiro não se deu, obrigatoriamente, direto das cidades do interior do estado. Várias pessoas passaram por Maceió, onde estabeleceram relações com pessoas da capital, algumas das quais também migraram para Niterói.
As famílias de Jacuípe têm sua origem principalmente ligada aos enge- nhos e usinas de cana-de-açúcar, enquanto os membros das famílias prove- nientes de Marechal Deodoro trabalharam nas fazendas de olericultura. Essa origem demonstra que a maioria dos migrantes não possuía experiência nem na pesca – e tampouco no mar. Contudo, alguns relatos indicam que certos ex-moradores de Marechal Deodoro haviam trabalhado como pescadores (tanto no mar como em lagoas).
Nos anos 1970, época em que os membros do grupo migraram para o “Sul”1, o Nordeste se caracterizava pelo trabalho nas roças, principalmente nas fazendas de cana-de-açúcar. Devido às inúmeras transformações no setor canavieiro, o grupo estudado, foi, como muitos nordestinos, levado a migrar para regiões mais promissoras, como o Sudeste. Povoa Neto (1994), ao estu- dar historicamente o processo de migração brasileiro, explica que a definição da região Nordeste se consolidou à medida que a região Sudeste recorreu à mão de obra nordestina, pois até os anos 1930 o país era basicamente divi- dido entre Norte (Amazônia e Nordeste) e Sul.
A migração é pensada como produto de imposições econômicas de determinado momento histórico, que trazem dificuldades para que os gru- pos se mantenham em uma determinada localidade, em função das poucas possibilidades de trabalho, expulsando-os do campo. Desta maneira, até meados dos anos 1950, antes das mudanças políticas e sociais no setor cana- vieiro – surgimento das usinas e declínio dos engenhos de cana-de-açúcar –, os trabalhadores podiam contar com um espaço para morada dentro dos limites das fazendas, dependendo da relação que estabeleciam com o proprie- tário, que era chamado de senhor. Nesse espaço os moradores podiam plan- tar e criar animais para a subsistência familiar. A produção excedente ainda poderia ser vendida na feira da cidade (Garcia Jr., 1989). Contudo, com o
- O grupo estudado refere-se à região Sudeste como “Sul”.desenvolvimento do setor, aqueles trabalhadores que residiam nas áreas das fazendas tiveram que deixar suas residências para dar espaço à ampliação dos cultivos e buscar novos locais de morada, tornando-se “moradores de rua”2 (Sigaud, 1979; Garcia Jr., 1989; Menezes, 2002).Foi nesse cenário de surgimento das usinas de cana-de-açúcar no Nor- deste que muitos trabalhadores perderam seu espaço de moradia e de subsis- tência dentro das fazendas onde trabalhavam. A história de uma migrante entrevistada, proveniente de Marechal Deodoro, ilustra essa situação:Meu pai trabalhava para o fazendeiro e nós podíamos fazer roça em algum terreno da fazenda, a gente criava também. A gente saiu da fazenda porque os donos começaram com plantação de cana, não deixavam mais a gente fazer roça nem criação, que era nosso sustento. Fomos morar mais perto da cidade, muita gente saiu de lá porque eles começaram a botar usina. Meu pai botou uma barraquinha em casa e criava no quintal.Conforme relatado pela entrevistada, diante dessa mudança, alguns de seus irmãos, inclusive ela própria, foram para Maceió em busca de trabalho. Na capital, ela trabalhou em casa de família, como doméstica, e um de seus irmãos trabalhou em uma fábrica, na qual fez amizade com um colega de Jacuípe. Um casamento entre membros das duas famílias estreitou ainda mais os laços.Apesar das possibilidades de trabalho na capital alagoana, da amplia- ção dos vínculos familiares e sociais, as condições aí conquistadas não foram suficientes para que as famílias permanecessem no Nordeste; em busca de melhores possibilidades de trabalho, dirigiram-se ao Rio de Janeiro.Do grupo analisado, a primeira pessoa a migrar para o Rio de Janeiro foi uma mulher, fato que difere do encontrado nos estudos sobre migrações, nos quais consta que geralmente são os homens que realizam os primeiros deslocamentos. Essa mulher contatou uma conhecida da família que já havia migrado para o município de São Gonçalo (RJ), na casa de quem ficou alo- jada até conseguir um posto em uma das fábricas de sardinha de Jurujuba, em Niterói. Mudou-se, então, para o local onde passou a morar em um barraco,
- Ao irem morar fora da área das fazendas, os trabalhadores passavam a trabalhar por diárias ou por empreitada, às vezes atuando em diferentes propriedades em uma mesma safra (Garcia Jr., 1989).como se referem às primeiras moradias, na praia (como ainda chamam a Tra- vessa dos Maricultores,3 onde residem).Aspectos da praia e dos barracos serão descritos posteriormente, pois neste momento é importante apresentar algumas informações sobre Juru- juba, ajudando o leitor a compreender o contexto da chegada dos migrantes ao bairro e também a razão para que o grupo se estabelecesse na praia.Da roça ao mar de JurujubaJurujuba localiza-se em uma península na entrada da Baía de Guana- bara, cercado pelas águas do mar e também pelas águas da Baía. A geografia acidentada delimita as praias e outras áreas do bairro, que foram sendo nome- adas pelos moradores de acordo com a história e as atividades desenvolvidas em cada local: Peixe-Galo (antigamente, Morro do Freixegal), Samanguaiá (Sambagoiá, Sambaguaiá ou Sambagaiá), Salinas, Várzea (praia da Vargem), Cascarejo, Lazareto, Ponta da Ilha, Cangunga, Brasília, Jurujuba ou Ponto Final e Pau Ferro. A configuração do espaço marca diferenças e influencia a organização social dos seus habitantes: a atividade mexilhoneira em escala comercial, por exemplo, passou a ser realizada quase que exclusivamente por moradores da Várzea, do Cascarejo e da Ponta da Ilha. Nesse sentido, o depoimento abaixo é bastante ilustrativo:O pessoal de Jurujuba, eles têm a área lá, eles já têm a área deles lá e nunca vieram para esse lado de cá. Só quem trabalhou na área de marisco foi só esse pessoal daqui, só daqui do Cascarejo e alguns daqui da parte da Salinas, que é 2% só. Jurujuba, eles tiravam, tiram mexilhão lá só para o uso deles. [...] cada um tem sua área aqui.A pesca, em Jurujuba, foi bastante importante até o final dos anos 1980; caracterizou o bairro como local de tradição pesqueira. Ali ainda existem um significativo ponto de desembarque de pescado e um escritório da colônia de pescadores; a festa de São Pedro, padroeiro dos pescadores, é celebrada anualmente.
- Com o engajamento dos migrantes em projeto governamental, no final dos anos 1980, a praia, local onde residiam, passou a ser denominada Travessa dos Maricultores.Nos anos 1970, a atividade pesqueira estava fortemente influenciada pela política nacional para o desenvolvimento da pesca da Superintendên- cia do Desenvolvimento da Pesca (SUDEPE), por conta do Decreto 221, de 1967. A SUDEPE “decidiu fazer da pesca uma atividade industrial de base – aumentando os incentivos fiscais, como a isenção de impostos para o estabelecimento de indústrias de pesca, financiamento de frotas e a isenção de taxas de importação de equipamentos, uma pesca empresarial-capitalista” (Diegues, 1983).Nesse sentido, Duarte (1999) demonstrou que empresários (tanto do bairro como de fora) passaram a investir na aquisição de embarcações maio- res quanto na implantação de fábricas de processamento de pescado, as conhecidas fábricas de sardinha. A política da SUDEPE deflagrou um cho- que de normas e valores em Jurujuba: demandou ajustes nas formas de pescar e atraiu novos moradores por conta das possibilidades de trabalho nas fábri- cas e outras atividades relacionadas à pesca.Com a crise da política da SUDEPE, a atividade pesqueira perdeu força, o número pescadores diminuiu, o bairro inflou e hoje muitas pessoas que vie- ram para Jurujuba estão envolvidas nas mais diversas atividades econômicas de Niterói e dos municípios do entorno. Veja-se, por exemplo, a pesquisa de Soares, Lima e Brandão (2005), que verificou que apenas 7,1% dos morado- res ainda “vivem da pesca”, enquanto na década de 1970, a pesquisa de Duarte indicava um percentual de 25%.Nas décadas de 1970 e 1980, Jurujuba tinha pelo menos três indús- trias de processamento de pescado, hoje inoperantes. Elas geraram empregos tanto para os moradores do bairro quanto para pessoas que vinham de outras localidades, a exemplo do grupo estudado. Uma migrante relatou: “Aqui não precisava estudo para arrumar emprego em fábrica”. O trabalho nas empresas de sardinha era facilitado pela necessidade de mão de obra, tendo em vista que, naquele momento, essa atividade vivia seu auge.A vinda do grupo estudado para Jurujuba se deu em busca de traba- lho, e seus integrantes não vislumbravam outra coisa senão um trabalho em melhores condições e com maior retorno financeiro do que encontravam no Nordeste. Esse fato é evidenciado no depoimento de um homem, natural de Jacuípe, hoje liderança comunitária:Olha só, nós viemos para trabalhar, nós saímos de lá no sentido de arru- mar um trabalho. Poderia ser o de pescador, poderia ser o de marisqueiro,conforme foi. Você vê, eu trabalhei na fábrica de sardinha, trabalhei dois anos, trabalhei em duas fábricas de sardinha. Você está me entendendo! Então quer dizer... Não tinha assim uma coisa ‘Ah! Eu vou para lá que eu vou trabalhar no mexilhão’. Eu vou, no sentido de arrumar um emprego, um trabalho, seja ele qual for. Deu sorte da gente entrar aqui no mexilhão pelo local da gente se alojar ter sido aqui.O relato indica que o trabalho “no mexilhão” está relacionado com as condições políticas e socioambientais da localidade na época em que o grupo chegou ao bairro. Cabe dizer que a maioria dos migrantes não conseguiu tra- balho diretamente como pescadores, mas atuaram em outras atividades: no processamento de pescado – uma das etapas da cadeia produtiva da atividade pesqueira; na extração de mexilhão, em uma fábrica de sorvetes das imedia- ções, nos estaleiros em Niterói, e também como porteiros, ascensoristas e auxiliares de serviços gerais em edifícios comerciais, no Rio de Janeiro.O depoimento acima ainda corrobora a afirmação de Sayad (1998) de que é o trabalho que insere os migrantes no contexto urbano, contribuindo para a formação e ampliação das redes sociais. É por meio do trabalho que se constituem enquanto migrantes, pois é ele que os caracteriza e que os identi- fica; é específico para um imigrante e requer um migrante.Tendo em vista as oportunidades de trabalho no bairro e na região, fosse nas fábricas de sardinha ou no extrativismo do marisco, a primeira migrante do grupo foi quem estimulou, por carta, familiares e amigos a migrar para o bairro. Na sua percepção, ela possuía tino para negócios, e avaliou que o extrativismo de mexilhão era pouco explorado comercialmente4 e, portanto, consistia em uma possibilidade de trabalho para aquelas pessoas que ainda estavam em Alagoas e desejavam vir para o Rio de Janeiro.Com as transformações ocorridas em decorrência do enfraquecimento da política da SUDEPE, a extração de mexilhões passou a ser realizada por diferentes grupos de Jurujuba. Alguns pescadores abandonaram a pesca; moradores do bairro, fossem naturais de outras cidades fluminenses ou de outras regiões, passaram a se dedicar à coleta e comercialização de mexilhão. Alguns grupos passaram a se dedicar integralmente a essa atividade enquanto
- Luiz Fernando Duarte , em comunicação pessoal, afirmou que na época de sua pesquisa nos anos 1970, “catava-se marisco como lazer nas pedras e costões” – a atividade era realizada, inclusive, por mulheres e jovens, embora não fosse economicamente significativa.outros se envolviam esporadicamente como uma forma de complementar a renda. Foi nesse cenário, entre os anos 1970 e 1980, que o grupo de nor- destinos estudado foi estimulado a migrar para Jurujuba, estabelecendo-se principalmente na praia de Várzea.Ao se lembrar da praia da Várzea, o grupo estudado relata que na épocade sua chegada em Jurujuba, existiam duas casas de alvenaria de moradores5mais antigos do bairro e alguns barracos,construídos pelos pescadores eutilizados para guardar os petrechos de pesca. Uma moradora nascida em Jurujuba lembra que era uma praia de areias claras, “era tudo limpinho”. Os barracos passaram a ser alugados para pessoas que procuravam trabalho nas fábricas de sardinha do bairro. Anteriormente à consolidação da comunidade nordestina na praia da Várzea, moraram ali grupos de várias cidades flumi- nenses – como, por exemplo, de Saquarema e Duque de Caxias – que traba- lhavam nas fábricas de sardinha e participavam da atividade mexilhoneira.Isso evidencia que houve uma apropriação do espaço utilizado pelos pescadores do bairro por pessoas de outros lugares e que os nordestinos não foram os primeiros a se instalar no local. Tanto a ocupação da praia por mem- bros de “fora” quanto a sua utilização para uma atividade menos valorizada que a pesca, que caracterizava o bairro, levaram a uma desvalorização do local. Isso corrobora um padrão verificado em estudos sobre migração, segundo o qual os migrantes acabam por se dedicar a atividades menos qualificadas e7por ocupar áreas menos valorizadas.6Os entrevistados lembram que ao chegarem a Jurujuba os barracoseramde tamanho reduzido, em madeira, com frestas entre as tábuas, cobertos com telhas Brasilite, em alguns casos, divididos através de meias paredes, numa configuração similar às casas dos arruadosnas fazendas do nordeste. As pes- soas que chegavam – cujo deslocamento se fazia por meio do auxílio finan- ceiro de famíliares, da venda de pertences, ou de recursos acumulados de suas atividades no Nordeste – se instalavam na casa dos familiares ou em barracos
- Barraco é a denominação dada pelos membros do grupo estudado, para os ranchos de pesca ou galpões de pesca, como indica Pessanha (2003) em sua pesquisa em Itaipu, Niterói.
- Atualmente essa área se localiza atrás de uma escola (a mais antiga do bairro) e, portanto, não é avistada por quem chega a Jurujuba, que possui uma única via de acesso.
- Com o tempo, as condições começaram a melhorar e os migrantes conseguiram construir casas de alve- naria no local dos barracos de madeira.providenciados por aqueles migrantes que já residiam no bairro em condi- ções precárias, como pode ser observado no seguinte relato:Quando a gente chegou aqui era um barraquinho pequenininho... Não tinha lugar de botar cama nem nada. Também quando a gente vem só traz roupa, mais nada. As camas da gente quando a gente chegou aqui eram bolsas do supermercado Sendas. Aí a gente botava aquelas bolsas forradas assim, botava pano, lençol e dormia assim. Eram nove pessoas [sendo duas crianças] dentro do barraquinho. Tudo assim dormindo um em cima do outro, minhas pernas serviam de travesseiro para eles. Eu acordava de noite com as pernas dormentes.Os barracos não tinham as mínimas condições sanitárias (esgoto e água). Sua estrutura não era capaz de evitar que a água entrasse, fosse proveniente de chuvas ou da maré. Quando a maré subia, a água entrava pela frente e pelo assoalho. Em algumas ocasiões, os migrantes tiveram que deixar as casas em função da maré e, nesses momentos, muitos dos moradores de famílias tradicionais do bairro demonstravam sua insatisfação com os migrantes nor- destinos dizendo coisas como “É hoje que os paraíbas voltam para o norte de caixote...”.Quando dava maré dessas cabeças d’água que você vê aí no litoral que sai derrubando tudo, para nós aqui não era diferente. Quando acontecia isso, nós éramos obrigados a ficar fora, saíamos dos nossos barracos, esperáva- mos a maré descer, e a vizinhança toda olhando, e às vezes até achavam graça dessa situação.Na época da minha pesquisa já não existiam barracos, tampouco a praia de areia lembrada num dos relatos. Todas as moradias eram de alvenaria e a areia da praia foi, ao longo dos anos, sendo aterrada, constituindo-se em um espaço restrito de socialização e de trabalho com o mexilhão. O trecho abaixo aponta para a importância da proximidade física e social do grupo:Aqui [na praia] é uma casa colada na outra... E tem um parentesco tre- mendo. Aqui todo mundo é família, alguns são de sangue, e outros de con- sideração. Digo família de sangue e família do Norte, né!Cabe mencionar que o grupo estudado é composto por membros de cinco núcleos familiares, provenientes dos municípios de Jacuípe e Marechal Deodoro, bem como de Maceió. O relato indica que por ocuparem o mesmo espaço físico, por terem vivenciado experiências e dificuldades comuns tanto no Nordeste quanto em Jurujuba, esses indivíduos acionaram solidariedades para resistirem e lidarem com o desafio de estar em um ambiente, de certo modo, adverso.Os elos de parentesco e de amizade possibilitavam essas relações de soli- dariedade, acionadas quando do seu deslocamento tanto para Maceió quanto para o Rio de Janeiro. Nessa linha, Galeski (1977) afirma que a pertença comum e as solidariedades daí resultantes extrapolariam os níveis comunitá- rios, podendo ser reproduzidas em outras localidades.A “invasão” nordestina8Apesar da solidariedade interna do grupo, ao chegarem à cidade os migrantes são percebidos como “invasores” (Penna, 1994) pelos morado- res mais antigos dos locais onde se estabelecem. Os migrantes sofrem com a exclusão social e o preconceito, o que se manifesta sobretudo nas dificuldades de acesso ao trabalho.No novo local eram chamados de paraíba,fato que revela como oestigma regional é transferido por mecanismos sociais (Bourdieu, 1998, 1993). No entanto, reforçavam sua identidade de alagoanos afirmando “Somos alagoanos!”. Quando indagadas sobre a visão estigmatizada viven- ciada, duas entrevistadas relatam:Muitos passaram a gostar da gente, a fazer amizade; outros não, outros já acham que ‘Ah! Chegou do norte, esses paraíba, já vem lá do lugar, esses paraíba’. O cara chama a gente de paraíba, sabe. Aí acham que a gente está invadindo o lugar deles. Acha que é do norte, não tem direito a nada, trata a gente de paraíba, tratam a gente com diferença. ‘Só falta ser paraíba!’. Não sabe ele, que quando a gente vem, vem para trabalhar, se a gente não tivesse vontade de trabalhar a gente ficava no lugar da gente passando dificuldade.
- Paraíba é uma denominação comumente dada aos migrantes nordestinos no Rio de Janeiro indepen- dente do estado de onde sejam provenientes.
Se fosse para viver de boniteza, lugar mais bonito que o nosso, as praias são as praias mais maravilhosas, né?! São lugares divertidos, as festas... A gente chega aqui, a gente estranha. Aqui a gente passa Natal em casa, lá tem muito divertimento, vai para festa em lugar público.
Antes olhavam para a gente como sem-terra que vinha atrás de serviço... Diziam: ‘Os sem-terra chegaram aqui e tomaram a casa da gente!’.
Esses relatos evidenciam tanto a condição do grupo no Nordeste, de trabalhadores rurais que foram expulsos de seus locais de origem, quanto o sentimento que alguns dos antigos moradores tinham de que seu lugar estava sendo utilizado, e mesmo invadido, por gente de fora.
Esse estigma não era só vinculado à origem dos migrantes, às caracte- rísticas que os diferenciavam dos moradores do bairro, mas também tinha relação com as suas condições de vida na praia da Várzea e com o trabalho no mexilhão, que era processado em frente às residências. O local ocupado pelos nordestinos passou a ser visto como uma área degradada, conforme lembrado por um migrante: “Os filhos [de Jurujuba] dizem que aqui é como favela e que fede”.
Os relatos acima evidenciam também que o grupo sofreu com a exclu- são social por parte dos “filhos de Jurujuba”, pois entraram em contato duas lógicas distintas de normas e valores. Além disso, eram vistos como concor- rentes aos postos de trabalho, ameaçavam a manutenção da vida social, não tinham relações de amizade ou parentesco com os antigos moradores e ainda eram provenientes de uma região estigmatizada (Elias, 2000; Comerford, 2003; Bourdieu, 1998, 1993).
Comerford (2003) aponta que os vínculos familiares são importantes para inserção e estabelecimento de pessoas de fora em um novo local, espe- cialmente em um bairro marcado por características tradicionais – como é o caso de Jurujuba. O autor ainda indica que as relações de parentesco consti- tuem um mecanismo de localizar, mapear os vínculos e a reputação de indi- víduos de fora.
No que diz respeito ao contato com os moradores mais antigos, um entrevistado de origem mineira, que acompanhou a chegada do grupo e chegou a trabalhar com ele no extrativismo do mexilhão, indicou a dificul- dade de entrosamento nos primeiros momentos. Essa dificuldade é atribu- ída pelo entrevistado à falta de referências de vínculos sociais dos migran- tes com os moradores do bairro, em um sentido semelhante ao mencionado
por Comerford (2003). O relato abaixo também aponta que o trabalho no marisco foi em parte responsável pela aproximação dos migrantes com famí- lias mais antigas do bairro:
A relação do pessoal daqui, a princípio, foi assim... não muito aconche- gante por causa da afinidade né... ninguém se conhecia, eles não tinham parente aqui. Quer dizer que ficou uma coisa para eles, assim, meio vazio. Mas com a continuidade dos daqui que já trabalhavam aqui com o mexi- lhão... com eles, começou a formar uma amizade, até porque que iam para o mercado junto. As famílias começaram a trabalhar com eles, na limpeza do mexilhão, porque não eles tinham a quantidade de pessoas para debulhá-lo. Então foi criando um vínculo e uma amizade.
Embora o relato acima indique que o trabalho no mexilhão foi um pro- pulsor da integração do grupo no bairro, a desvalorização dessa atividade pelos pescadores e outros moradores reforçava o processo de estigmatização. Uma liderança comunitária demonstra, em seu depoimento, como a atividade mexilhoneira era percebida pelos moradores mais tradicionais de Jurujuba:
[...] era como se o marisqueiro na época fosse o lixeiro de alguns tempos. Mas na época não se tinha essa consciência – aí lixeiro, assim era o maris- queiro. As mulheres que trabalhavam no marisco, elas tinham vergonha, se você chegasse dentro no ônibus e falasse com ela assim: ‘Vai pro marisco hoje?’, ela não te respondia... Só se você perguntasse baixo, baixinho, no ouvido, aí ela: “Vou sim”, mas ninguém ia escutar, você está me enten- dendo?! Que elas tinham vergonha porque era uma situação assim... O marisqueiro era um coisa assim, igual a uma profissão que não tinha um valor, não era reconhecido; agora, hoje, não.
Cabe também mencionar que até o final dos anos 1980 os marisqueiros trabalhavam, de certa forma, em situação de igualdade social, apesar do tra- balho ser realizado por grupos distintos, baseados nas relações de proximi- dade familiar e de amizade.
A comercialização do mexilhão era realizada no mercado da Praça XV, na época o principal entreposto de pescado do Rio de Janeiro. Em alguns casos, a falta de recursos financeiros fazia com que alguns marisqueiros
entregassem seu produto para pessoas com melhores condições de revender sua produção no mercado.
Assim foi se consolidando um sistema de intermediação na comercia- lização do produto, com a presença de atravessadores locais. Com isso, ini- ciou-se certa diferenciação social entre os marisqueiros da localidade e foi estabelecida uma relação de dominação-subordinação entre atravessadores e marisqueiros. Os entrevistados apontaram que, com a presença dos atravessa- dores, eles não podiam mais trabalhar no ritmo e com a flexibilidade de antes. Essa situação foi uma das motivações para a participação dos marisqueiros no projeto Mexilhão Rio.
O projeto era orientado pela concepção do desenvolvimento susten- tável. A conservação ambiental se daria a substituição da extração pelo cul- tivo de mexilhões. Em termos econômicos e sociais, a formalização de uma associação (criada em 1992) fortaleceria os marisqueiros. Um dos resultados desse projeto foi a construção de um centro de beneficiamento de mexilhões, o qual permitiria um incremento na qualidade, agregação de valor ao pro- duto gerando emprego e aumento da renda.
Pode-se dizer que o projeto impulsionou a consolidação e o fortaleci- mento de um grupo social que buscava uma nova identidade para driblar a exclusão social. Nesse sentido, é importante ressaltar que o processo propi- ciou certa reversão de uma situação de exclusão para uma de reconhecimento.
Wieviorka (1997, p. 18) afirma que a “exclusão é produto da incapa- cidade dos indivíduos se constituírem enquanto atores [...]; e como se faz parte de um grupo pouco estruturado e organizado é difícil de escapar indi- vidualmente à estigmatização do grupo”. A formalização da referida associa- ção significava a possibilidade dos membros do grupo se fortalecerem e se constituírem enquanto atores sociais importantes no bairro e fora dele, assim como de romperem as relações de dominação e sujeição experimentadas no Nordeste – que se reproduziram, em certa medida, em Jurujuba no que con- cerne à comercialização do mexilhão.
Nesse sentido, tanto Wieviorka (2005) quanto Goffman (1975) afir- mam que as mudanças de significado do preconceito ou do estigma em busca de uma identidade coletiva podem ser possibilitadas e facilitadas através de apoio de pessoas, grupos ou instituições, tais como a igreja, intelectuais e pes- soas ligadas à mídia. Para Goffman (1975, p. 57), quando o indivíduo estig- matizado estabelece um “relacionamento ‘com’ alguém de nossa sociedade” e é visto com essa pessoa “a identidade social daqueles com quem o indivíduo
está acompanhado pode ser usada como fonte de informação sobre sua pró- pria identidade social, supondo-se que ele é o que os outros são”.
A literatura aponta que é comum os migrantes ocuparem uma posição desprivilegiada na sociedade, entretanto, o grupo estudado conquistou um status no bairro e conseguiu se projetar de tal forma que hoje é uma referência para alguns setores da sociedade quando se faz menção à maricultura.
Poder-se-ia inferir que possivelmente o maior ganho para os nordesti- nos com o seu engajamento no projeto Mexilhão Rio esteja relacionado ao incremento do capital social e simbólico do grupo. Quando relatam que no passado os nordestinos não eram pensados como possíveis cônjuges e, hoje, “as mulheres correm atrás deles”, ou ainda, quando afirmam que “passaram da favela a Alphaville”,ou também que “mudaram da Rocinha para a Avenida Atlântica”, estão fazendo referência a sua mudança de status.
Pode-se afirmar que tanto na sua própria percepção quanto na de outros moradores, a imagem do grupo de migrantes passou por uma reelaboração em função dos vários processos de mudança ocorridos. Nesta pesquisa, pode-
-se afirmar que o fortalecimento, a ascensão social e o reconhecimento do grupo estudado se deram principalmente por meio do apoio governamental na articulação do projeto Mexilhão Rio.
Esse projeto possibilitou a organização do grupo de migrantes, influen- ciando sua forma de se relacionar com outros atores do bairro de Jurujuba e de fora dele. O estabelecimento e ampliação das redes sociais e parcerias base- adas em interesses convergentes – e também na confiança entre diferentes atores – proporcionou um engajamento político da associação em questões que extrapolam os limites do bairro.
Considerações finais
Grande parte do grupo estudado não tinha, antes de se estabelecer em Jurujuba, experiência com atividades extrativas marinhas, não possuía conhe- cimento sobre o mar, marés, técnicas e condições climáticas. Conforme rela- tado durante a pesquisa, eles aprenderam a técnica da extração de mexilhões com antigos moradores, muitos dos quais ainda exercem a atividade. Diante do exposto, uma investigação sobre o processo de aprendizado da extração de mexilhões pelos migrantes contribuiria para o campo das representações
sociais; da relação entre técnica, cultura e natureza; das estruturas cognitivas desenvolvidas para a compreensão e realização do extrativismo no mar.
Ao longo da pesquisa foram identificados vários grupos que se dedica- vam a maricultura, alocando seus cultivos em função da disponibilidade de espaço no mar, mas também em relação à proximidade dos locais de proces- samento. Considerando que a política ambiental de gestão e ordenamento dos recursos naturais e do espaço marinho influenciam diretamente a mari- cultura, o cultivo de mexilhões está sujeito a normas e procedimentos de legalização, o que exige um processo de adaptação para a incorporação de novas práticas. Nesse sentido, uma análise da atividade aquícola em Jurujuba poderia evidenciar as possíveis resistências e dificuldades dos trabalhadores em se adequar e cumprir o atual sistema legal brasileiro, bem como a relação entre as diferentes formas de conhecimento.
Agradecimento
Agradeço ao Programa de Pós-Graduação EICOS/UFRJ; à CAPES, pela bolsa concedida durante a pesquisa realizada no curso de doutorado; aos pesquisadores Tânia Maciel, Elina Pessanha, Icléia Thiesen, Marco Aurélio Santana e Afrânio Garcia Júnior, que me orientaram neste trabalho.
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Resumo: Este trabalho analisa o processo de migração de um grupo de alagoanos para o bairro de Jurujuba, localidade com marcante tradição na atividade pesqueira de Niterói (RJ). Fazendo uso do arcabouço teórico referente aos processos migratórios, à memória social e à história oral, foi possível verificar os mecanismos utilizados pelo grupo para se estabelecer e se integrar na localidade. Entre esses mecanismos, merece destaque a prática de extração de mexilhões e, posteriormente, a maricultura. O ingresso na maricultura se deu pelo engajamento em um projeto que favoreceu para o reconhecimento do grupo tanto na comunidade de Jurujuba quanto no âmbito do setor produtivo estadual. Cabe dizer que o envolvimento nesse projeto contribuiu para que o grupo estudado não retornasse ao seu local de origem, ao contrário do que frequentemente descrevem outros estudos sobre migração.
Palavras-chave: identidade, migração, memória coletiva, reconhecimento social.
“From the slums to Alphaville”: memories from a migrant group from Alagoas in the fishing community of Jurujuba, Niterói (RJ)
Abstract: This article analyzes the process of migration and establishment of a group from Alagoas to Jurujuba, Niterói (RJ), a district with remarkable tradition in the fishing activity. As a theoretical frame I articulated the concepts of Migration, Social Memory and Oral History, making it possible to verify the social mechanisms used by the group to integrate into the new environment and settle in the locality. Among these strategies it must be mentioned the practice of extracting mussels and subsequently the mariculture. Joining the mariculture was possible because the group engaged in a project that contributed to the recognition of the group in Jurujuba and within the state productive sector. One could say that such integration has contributed to the fact that the studied group did not return to their place of origin, as opposed to what is often described in migration studies.
Keywords: identity, migration, collective memory, social recognition.
Recebido em 30/01/2013 Aprovado em 15/04/2013
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